segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Em seis anos, oito mil advogados deixaram a profissão

Quase oito mil advogados suspenderam a sua inscrição na Ordem dos Advogados de Portugal (OAP) nos últimos seis anos. Em 2010, até ao passado dia 22 de dezembro, foram registadas 809 suspensões de inscrições na Ordem, o que ainda assim representa uma diminuição significativa face a anos anteriores. Só em 2004, houve 1982 advogados que abandonaram a profissão. Em Portugal existe um advogado por cada 243 habitantes. As informações são do Jornal Público de Lisboa.

"Não há clientes para tantos advogados", considera o bastonário, António Marinho e Pinto, afirmando que esta situação é "um exemplo típico da massificação da advocacia", fenomeno ao qual declarou "guerra" desde o início do seu mandato. "Não há trabalho para os 27.500 advogados que exercem a profissão em Portugal", diz.

Pedro Miguel Branco, advogado no Porto, tem outro entendimento. O atraso no pagamento das defesas oficiosas é um dos problemas que têm levado muita gente a "ponderar deixar a profissão" e a "enviar currículos para novos empregos".

Os advogados têm de adiantar, do seu bolso, as despesas relacionadas com os processos dos cidadãos que não têm meios para assegurar a sua defesa em tribunal, entre as quais se incluem transportes para deslocações, fotocópias e custas de outros documentos. Compete, depois, ao Ministério da Justiça reembolsá-los desses gastos, o que, ao longo dos anos, tem sido feito com atrasos significativos. Uma situação considerada "insuportável" por quem sobrevive praticamente apenas à custa das defesas oficiosas: muitos jovens advogados sem clientes.

"Os defensores e patronos oficiosos têm em atraso os honorários e despesas devidos dos últimos três meses", diz Pedro Miguel Branco, salientando que o Instituto de Acesso ao Direito informou que "não existe qualquer data ou previsão para que sejam regularizados tais incumprimentos". Segundo este advogado, "centenas" de colegas "já deixaram de exercer nos últimos meses, dado os atrasos nos pagamentos de honorários e despesas por parte do Estado", a que se acrescentam "os incumprimentos por parte dos cidadãos particulares que a eles recorriam para resolver litígios judiciais e extrajudiciais".

Para Miguel Branco, o ano de 2011 "será desastroso para muitos jovens advogados que terão de procurar emprego noutras profissões, dado dependerem das verbas provenientes do Sistema de Acesso ao Direito para poderem continuar a exercer". E acusa os responsáveis da Ordem de exigirem o pagamento e de "nada fazer para criticar a inação do Ministério da Justiça" quanto ao pagamento aos advogados.

Procurado pelo Jornal Público, o Ministério da Justiça não confirma o atraso de três meses no pagamento aos advogados, salientando que o Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça "já pagou as despesas e honorários remetidos pela Ordem dos Advogados.

Numa nota enviada através do seu gabinete de imprensa, o ministério assegura que "tem vindo a desenvolver esforços no sentido de reduzir os prazos de pagamento, melhorando e agilizando os procedimentos". Como exemplo, destaca a criação, em finais de 2008, do "novo regime de Acesso ao Direito e aos Tribunais, com a desmaterialização de todo o processo, eliminando a intervenção dos tribunais na elaboração das respectivas notas de despesas e honorários", o que tem resultado numa "redução nos prazos de pagamento".

"O problema é que o Estado não tem dinheiro", diz Marinho e Pinto, garantindo: "Nós temos pressionado para que os honorários sejam pagos atempadamente".

A insatisfação e o desencanto relativamente à profissão de advogado resultam, insiste o bastonário, do número excessivo de advogados em Portugal. Segundo os dados da Ordem, são 43.868 no total. Destes, 27.533 estão inscritos na Ordem e exercem a profissão, o que se traduz na existência de um advogado por 243 habitantes - "isto só se verifica em certos países da América Latina", nota Marinho e Pinto.

Com a inscrição suspensa há 15.612 advogados, 14.706 dos quais a título voluntário. Os restantes deixaram de exercer por reforma ou por questões disciplinares.

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