terça-feira, 30 de outubro de 2012

Advogado que devolver processo pode não sofrer sanção

Advogado que tenha retido autos de processos, mas que os tenha devolvido dentro do prazo previsto em intimação publicada em Diário Oficial, pode ficar livre de sanção disciplinar. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou, em caráter conclusivo, o Projeto de Lei 7.135/2010, do deputado Hugo Leal (PSC-RJ). 

A proposta mudará o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil — Lei 8.906/1994 —, que entende como infração disciplinar o ato de reter, abusivamente, ou extrair autos recebidos com vista ou em confiança. A pena aplicada, no caso, é de, no mínimo, 30 dias de suspensão.

O Tribunal de Ética da OAB, no entanto, entende que não é infração disciplinar se houver a devolução de autos logo após a intimação. O texto segue agora para o Senado, a menos que haja recurso para análise pelo Plenário da Câmara.

Advogado não precisa de poderes especiais para declarar pobreza

O empregado teve negados seus pedidos pela decisão de 1º Grau. Só que, além disso, foi condenado a pagar custas processuais de mais de R$3.000,00. Tudo porque o juiz sentenciante indeferiu o pedido de justiça gratuita, fundamentado no fato de o trabalhador não ter concedido poderes específicos para seus advogados declararem a sua condição de pobreza, mas apenas para pedir a gratuidade da justiça. Mas o reclamante não se conformou com a sentença e apresentou recurso, que foi distribuído à 9ª Turma do TRT-MG. 

E a Turma, acompanhando o voto da desembargadora Mônica Sette Lopes, deu razão ao trabalhador. Conforme explicou a relatora, para a concessão do benefício da gratuidade judiciária ao empregado, basta que ele receba salário inferior ao dobro do mínimo legal ou preste declaração de que não tem condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou do de sua família. Isso é o que dizem os artigos 790, parágrafo 3º, da CLT e 4º, da Lei 1.060/1950. É desnecessária a outorga de poderes especiais ao patrono da causa para firmar declaração de insuficiência econômica, destinada à concessão dos benefícios da justiça gratuita, como consolidado na OJ 331 da SDI-1 do TST, frisou. 

Levando em conta que o reclamante declarou na petição inicial, por meio de sua advogada, que é pobre no sentido legal, não podendo arcar com custas e despesas do processo, a desembargadora deu provimento ao seu recurso, para conceder a ele a justiça gratuita e isentá-lo da obrigação de pagar custas processuais. ( 0001791-77.2011.5.03.0044 RO )

Advogado de corréu pode participar do interrogatório de outros acusados

Embora o Código de Processo Penal (CPP) determine que os interrogatórios dos réus sejam individuais, nada impede que o advogado de outro corréu participe do questionamento. Essa foi a posição adotada de forma unânime pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar pedido de habeas corpus em favor de um engenheiro responsável por obra que desabou no município de Içara (SC).

O engenheiro e dois corréus, o dono da obra e o construtor, foram acusados pelos crimes de homicídio e lesão corporal culposos, previstos nos artigos 121 e 129 do Código Penal. Apenas o engenheiro foi condenado, mas pelo crime de desabamento (artigo 256).

No habeas corpus impetrado no STJ, alegou-se constrangimento ilegal e cerceamento de defesa, já que o defensor do condenado foi impedido de participar ativamente dos interrogatórios dos corréus. A defesa afirmou que houve delação por parte destes, o que teria levado à condenação do engenheiro.

Também afirmou que o representante do Ministério Público pôde participar dos questionamentos, em desrespeito ao princípio da “igualdade de armas”. A defesa apontou ainda outros prejuízos ao réu, pois um pedido por nova perícia não foi acatado e a pena foi fixada acima do previsto em lei.

Garantias constitucionais

A ampla defesa e o contraditório são direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988, ressaltou o relator do habeas corpus, ministro Jorge Mussi. Segundo ele, não é possível dissociar a produção de provas dessas garantias ao acusado. Isso é particularmente relevante em processos como esse, em que há corréus em ação penal com teses conflitantes.

O ministro reconheceu que o STJ já tomou decisões negando ao advogado de um réu o direito de participar do interrogatório de corréus, pois estaria interferindo no direito de defesa destes. Porém, nos julgados mais recentes da Corte e do Supremo Tribunal Federal (STF), essa participação tem sido admitida.

“Uma leitura de todos os dispositivos que disciplinam o interrogatório não permite a conclusão de que a defesa do corréu não tem o direito de questionar o outro que está sendo interrogado, ainda que este não possa ser considerado testemunha”, esclareceu o relator.

Direito ao silêncio

O artigo 191 do CPP determina que, no caso de pluralidade de réus, eles serão interrogados separadamente. Para o ministro Mussi, isso não leva à conclusão de que a participação do defensor de outro dos réus seja vedada. Essa participação é especialmente importante nas situações em que a tese de defesa de um dos réus imputa a responsabilidade aos corréus.

“Para que tais declarações possam ser validamente sopesadas pelo julgador, mister que se tenha dado a oportunidade do contraditório a todos os interessados, sob pena de se ter incutido no processo um meio de prova produzido ao arrepio de garantias constitucionais”, concluiu.

O ministro Mussi também observou que, ao ser questionado pelo advogado de outra parte, o réu não fica na condição de testemunha, mantendo seu direito ao silêncio, assegurado pelo artigo 186 do CPP. Com essas considerações, o relator anulou a ação penal desde os interrogatórios, assegurando a todos os corréus o direito de, por seus advogados, formular perguntas aos demais acusados.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Advogado do falido tem direito a honorários de sucumbência em processo falimentar

O advogado que representa o falido na discussão dos créditos falimentares deve receber honorários de sucumbência caso seja vitorioso. A decisão foi dada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso da fabricante de calçados Cosipla S/A contra o Banco do Brasil. A Turma considerou que os honorários são devidos ao advogado da massa falida e também ao do falido.

A Cosipla declarou sua falência e o Banco do Brasil pediu a habilitação de créditos contra ela, no valor aproximado de R$ 465 mil. O montante foi impugnado duas vezes e fixado pela 1ª Vara da Comarca de Farroupilha (RS) em cerca de R$ 315 mil. A decisão também determinou que a massa falida receberia, a título de honorários, 10% do valor da diferença entre o crédito pretendido pelo banco e o efetivamente habilitado. O órgão julgador entendeu que era inadmissível a fixação de honorários em benefício do advogado do falido, que é a própria empresa. A sentença foi mantida em segunda instância.


No recurso ao STJ, alegou-se que o julgado ofendeu o artigo 22 da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), que regula o pagamento de honorários aos advogados. O recurso afirmou que houve atuação do profissional na divergência sobre os créditos, o que permitiu a intervenção no processo falimentar.


Participação do falido

O falido pode ser o empresário individual ou a sociedade empresária. Sua posição nesse tipo de processo é essencial para esclarecer a questão, segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso. Ele destacou que a antiga Lei de Falências (Decreto-Lei 7.661/45), vigente quando a ação foi proposta, atribuía vários deveres ao falido, como a participação no processo. Por outro lado, prosseguiu, essa participação é também considerada um direito, já que se exercem simultaneamente o dever de auxílio e o direito de fiscalizar seus interesses.


Quando o falido defende seus interesses, ele assume a posição de litisconsorte, ou seja, sua relação jurídica com uma das partes pode ser influenciada pela sentença. Para o ministro, seria uma “assistência litisconsorcial sui generis”, pois, apesar de a massa falida ser uma comunhão dos bens remanescentes e interesses dos credores, representados pelo síndico ou administrador, muitas vezes pode haver confronto com os interesses do falido.


Considerando que o falido assume a posição de assistente litisconsorcial, o ministro entendeu que dever ser aplicado o artigo 52 do Código do Processo Civil (CPC), que determina ser o assistente sujeito aos mesmos ônus processuais que o assistido. Logo, não é possível negar a ele, em contrapartida, os benefícios. “As regras de sucumbência aplicáveis devem ser as mesmas aplicadas às partes principais, mormente a que enuncia que, ‘concorrendo diversos autores ou diversos réus, os vencidos respondem pelas despesas e honorários em proporção’ (artigo 23 do CPC)”, esclareceu.


O ministro Salomão concluiu que, se o falido intervém no processo de habilitação de crédito como assistente litisconsorcial, deve também se beneficiar dos ônus de sucumbência da parte vencida. O relator fixou os honorários em R$ 5 mil, que avaliou como razoáveis para o trabalho desenvolvido nos autos. Seu voto foi acompanhado de forma unânime pela Quarta Turma.

MP poderá ter assento junto a advogados quando for parte

A Câmara analisa o Projeto de Lei Complementar 179/12, do deputado licenciado Carlos Bezerra (PMDB-MT), que altera a posição do assento dos membros do Ministério Público (MP) em julgamentos, quando eles atuarem como partes no processo.

Atualmente, promotores, procuradores e congêneres sempre se sentam no mesmo plano e imediatamente à direita dos juízes ou presidentes dos órgãos judiciários perante os quais oficiem – seja atuando como fiscal da lei ou como parte do processo.


A proposta mantém a posição de sentar-se do membro do MP quando ele atuar como fiscal da lei, mas estabelece que, quando atuar como parte do processo, ele deverá sentar-se juntamente com os advogados da outra parte. A intenção do autor é conferir “tratamento igualitário e imparcial entre acusação e defesa”.


“Por que o membro do Ministério Público deve ficar em plano superior à outra parte?”, questiona Bezerra. “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e integrantes do MP, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”, complementa.


O texto altera a Lei Complementar 75/93, que trata da organização, das atribuições e do estatuto do Ministério Público da União.


TRAMITAÇÃO - O projeto, que tramita em regime de prioridade, será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e pelo Plenário.


Íntegra da proposta:

•PLP-179/2012  

Petição incial deve se limitar a fatos ocorridos

A Justiça do Distrito Federal decidiu pela suspensão da petição inicial dos autos de um processo por considerar que o autor não atendeu aos requisitos previstos no artigo 282 do Código de Processo Civil. A decisão foi da juíza Sandra Cristina Candeira de Lira, da 2ª Vara Cível de Taguatinga, após ter sido solicitado por duas vezes que o autor fizesse emendas na petição inicial para que esta se limitasse apenas aos fatos ocorridos.

No caso, o advogado Rogerounielo Rounielo de França, que atua em causa própria, reclama pelo atraso na entrega pela construtora de um apartamento que ele comprou na planta.Em sua petição inicial, de 137 páginas, o advogado reuniu, de forma confusa, um vasto material para explicar os potenciais danos que ele poderia sofrer. Como explica em um e-mail, ele mergulhou fundo na matéria. “Registramos que na petição inicial realizamos profundo mergulho jurídico, econômico e financeiro, envolvendo os autores, enquanto consumidores, o réu Itaú Unibanco S.A. (instituição financeira) e o réu Avila Empreendimentos Imobiliários S.A. (construtora), para desnudar, de forma profunda, com riqueza de detalhes, em todos os aspectos, conhecidos e desconhecidos dos consumidores, em geral, e muitas vezes desconhecidos de todos àqueles que, direta ou indiretamente, mantém contato com essa matéria (governantes, criadores de políticas públicas de habitação, desembargadores, juízes, advogados, promotores etc., envolvidos com resolução de lides da espécie), o modelo de negócios de construção e venda de imóveis, na planta, no Brasil, para que se faça justiça, para minha família, neste processo, e, também, para que se faça justiça, para outras famílias, em outros processos análogos a este, com a firme esperança de que a experiência de minha família, nesta causa, sirva para melhorar, de alguma forma, as relações negociais, jurídicas e judiciais, deste tipo de negócio, no Brasil, equilibrando, melhor, as relações de forças, especialmente a dos inocentes consumidores que, na verdade, são grandes vítimas desse complexo e incompreensível modelo de financiamento e construção de imóveis, na planta, no Brasil, idealizado pelas construtoras e instituições financeiras”. Claro como a luz do dia, certo?

A juíza Yeda Maria Morales Sánchez não entendeu assim. Ou simplesmente não entendeu e determinou que o autor emendasse a inicial. E não perdeu a oportuniade de repetir a lição: a inicial deve conter a lesão de direito atual, não por fatos futuros. De acordo com ela, o autor elencou fatos sequer ocorridos no pedido de mérito. A juíza solicitou ainda a exclusão diversos fundamentos fáticos e jurídicos inseridos na inicial. Foi estabelecido o prazo de 10 dias para que fosse apresentada nova versão do documento, sob pena de indeferimento da inicial.

Apresentada a emenda à inicial, que passou de 137 para 221 páginas, coube à juíza Virgínia Fernandes de Moraes Machado Carneiro analisar a nova peça inicial. Segundo a juíza, “a inicial e a emenda apresentadas pelos autores são confusas, de difícil compreensão e com inúmeros trechos inúteis e desnecessários para a solução da controvérsia”. A juíza alertou ainda que “as formalidades nunca devam se sobrepor aos bens jurídicos a serem tutelados, uma petição bem elaborada e consentânea a certas regras de processo também auxilia na proteção do direito especialmente porque as peças processuais devem ser escritas de forma coerente e lógica para que seja possível a compreensão não apenas pelo magistrado, mas pelas outras partes envolvidas”.

Em seu despacho a juíza ressaltou que é dispensável e improdutivo a transcrição integral de artigos jornalísticos, de mensagens eletrônicas e de links para artigos publicados na internet que não criam nem constituem direito dos autores. “A título exemplificativo, em dezesseis páginas (26/42), os autores mencionam quarenta e três artigos doutrinários e seus respectivos links referentes à situação econômica mundial e ao sistema financeiro. Da mesma forma, mostra-se prescindível a reprodução, integral de documentos que comprovam as alegações porquanto acompanham a inicial e fazem parte do caderno processual”, esclarece a magistrada na decisão.

Também foi solicitada a exclusão da peça o currículo, cursos ou atividades que o autor realizou bem como as mensagens religiosas ou filosóficas apresentadas na emenda, tais como "Adoremos o Pai Universal! Saudemos o Ser Supremo".

Sob pena de indeferimento da inicial e revogação da tutela antecipada que foi dada na primeira decisão, a juíza deu um prazo de 10 dias para alteração na peça inaugural “a fim de torná-la inteligível e facilitar a compreensão do assunto, devendo: a) excluir todas as transcrições de matérias jornalísticas, links de internet, advertências religiosas e filosóficas, currículo do autor, mensagens eletrônicas, reproduções de documentos que acompanham a inicial, dentre outros trechos inúteis e desnecessários; b) apresentar os fatos e fundamentos jurídicos de forma sucinta, concisa, mas com as informações essenciais à análise da matéria; c) formular pedidos certos e determinados, bem como breves e precisos porquanto a forma como foram apresentados (trezes páginas só de pedidos) inviabilizam até mesmo a compreensão do que efetivamente pretendem os autores.”

Como os pedidos não foram atendidos a juíza Sandra Cristina solicitou que fosse retirada dos autos a petição e outros documentos. A juíza não analisou o pedido de antecipação de tutela pois não foi atendida a determinação da emenda. 

Clique aqui para ler a petição inicial com emendas
Clique aqui para ler a decisão da juíza Yeda Sánchez
Clique aqui para ler a decisão da juíza Virgínia Carneiro
Clique aqui para ler a decisão da juíza Sandra Cristina

terça-feira, 23 de outubro de 2012

100 maiores bancas faturaram US$ 81,9 bilhões

O ranking das 100 maiores bancas do mundo, por desempenho financeiro, indica que as firmas de advocacia continuam crescendo, apesar das turbulências econômicas. As receitas brutas combinadas das bancas que entraram no "2012 Global 100", que acaba de ser divulgado, foram de US$ 81,9 bilhões no último ano fiscal — a maior de todos os tempos, de acordo com a publicação The American Lawyer, que compilou os dados com a colaboração da publicação Legal Week. O crescimento foi de 6,8% em relação ao ano anterior.  

Segundo o site Law.com, que pertence ao mesmo grupo, o ranking mostra a resiliência do mercado jurídico em tempos de crise. E confirma um velho ditado americano: "Faça chuva ou faça sol, sempre haverá clientes para as firmas de advocacia" — no caso, diz a publicação, a referência vale para os grandes clientes corporativos. E mostra também que as grandes se tornaram ainda maiores. Mas não há, nem de longe, perspectivas de dominação do mercado por alguma banca, nem mesmo por um grupo de escritórios, garante o Law.com.  

A Baker & McKenzie, organização americana que se estruturou no modelo "verein" para se lançar no mercado internacional, continua a ocupar a primeira posição no ranking mundial, com faturamento de US$ 2,313 bilhões no último ano fiscal. A DLA Piper, que ocupava a terceira posição no ano anterior, passou para o segundo lugar, com faturamento de US$ 2,247 bilhões. Deixou para trás a Skadden Arps Slate Meagher & Flom, que mantém sua estrutura nacional e faturou US$ 2,165 no último ano fiscal. A banca mais "modesta" entre as grandes, colocada no 100º lugar, a Steptoe & Johnson, faturou US$ 376 milhões no período. Observe-se, em nome da proporção, que a Baker & McKenzie tem 4.004 advogados, 725 sócios, enquanto a Steptoe & Johnson tem 422 advogados, 148 sócios.  

Modelo e fenômeno

 O modelo "verein" se estabeleceu como novo fenômeno das sociedades de advogados que buscam penetração no mercado global. Na verdade, passou-se a usar o termo "verein" como uma simplificação da expressão "Swiss verein" – o "verein" no estilo suíço. "Verein" é uma palavra alemã (que também pode ser "vereinen") que significa associação voluntária. O "verein" à la Suíça criou uma estrutura mais conveniente para muitas organizações internacionais, incluindo as firmas de advocacia. 

De acordo com a Wikipédia, a "verein" suíça não precisa ser registrada para ter uma personalidade jurídica separada. Uma estrutura "verein" é ideal, por exemplo, para a formação de uma organização não governamental (ONG) internacional, tais como a Anistia Internacional. Mas é conveniente, também, para a estruturação de firmas que estabelecem escritórios em diversos países. Uma das vantagens é a de que o controle da firma pode ser descentralizado. Ou seja, os escritórios só têm obrigações com as entidades reguladoras do país onde estão estabelecidos. O sistema reduz custos e permite que cada escritório opere fundos diferentes de receitas e lucros.

O modelo "verein" transformou o cenário do mercado jurídico no mundo e os rankings mundiais, diz a publicação Law.com. Bancas, como a Squire Sanders, a SNR Denton e a Norton Rose, subiram rapidamente no ranking depois que adotaram o sistema, embora tenham também expandido o seu foco doméstico. O advogado Jonathan Scott, sócio da Herbert Smith Freehills, disse à Law.com que as grandes bancas esperam que a expansão do mercado jurídico para mercados internacionais continue. Afinal, esse é o único meio, praticamente, para promover o crescimento das bancas que já são muitos grandes dentro de seus próprios mercados. 

Dados do ranking

 A credibilidade do ranking da The American Lawyer e da Legal Week, ambas do grupo The Am Law, é comparável aos relatórios da Global Chambers e do Citi Private Bank Law Firm Group. Os resultados diferem circunstancialmente, devido à metodologias diferentes usadas pelas organizações. Os dados para a formação do ranking 2012 Global 100 foram compilados com base nos resultados financeiros do ano calendário de 2011, para as bancas dos Estados Unidos, e no ano financeiro de 2011-2012, para as bancas do Reino Unido e outras bancas internacionais. Os resultados financeiros foram obtidos de informações prestadas pelas próprias bancas.

Entre as 100 potências listadas no ranking de 2012, 23 bancas obtiveram receitas anuais superiores a US$ 1 bilhão. No ranking anterior, foram 21 bancas. As receitas brutas registraram um crescimento de 6,8% em relação ao período anterior, confirmando-se como o maior faturamento combinado das "100 mais" de todos os tempos: US$ 81,9 bilhões.

O faturamento combinado das 25 primeiras colocadas no ranking cresceu 6,9% — para US$ 38,9 bilhões. As bancas classificadas da 26ª a 50ª posição cresceram 6,2% — faturamento combinado de US$ 19,4 bilhões. O faturamento combinado das bancas nas 50 primeiras posições cresceu 6,6% — total de US$ 57,5 bilhões. Foi o faturamento das bancas classificadas na metade debaixo da tabela, porém, que teve o maior crescimento: 7,3% — no valor de US$ 24,4 bilhões.

O lucro de cada sócio das "100 mais" cresceu, em média, 3,65% — isto é, US$ 1,518 milhão por ano. Os sócios das "25 mais" tiveram, em média, 4% de aumento— isto é, cada sócio ganhou, em média, US$ 2,574 milhões por ano. O faturamento bruto de 23 bancas foi superior a US$ 1 bilhão no período. E de 74 bancas foi superior a US$ 1 milhão. Entre as 100 maiores, 24 bancas têm escritórios em dez ou mais países (eram 20 no ano anterior). Também entre as 100 maiores, 14 têm pelo menos 50% de seus advogados trabalhando em outros países (no ano passado eram nove).  

Impacto das "vereins"

 Entre as bancas classificadas nas primeiras 25 posições, cinco adotaram a estrutura "verein" — três delas, entre as dez maiores: Hogan Lovells, Baker e DLA. Há cinco anos, a Baker era a única "verein" entre as 100 maiores. A DLA Piper começou a operar um sistema de fundos separados de receita doméstica (EUA) e internacional em 2010. 

Se o faturamento combinado das "vereins" fosse excluído do ranking, o crescimento das receitas brutas das restantes das firmas cairia de 6,8% para 4% no último ano. Foram essas bancas que tiveram maior crescimento. A Squire Sanders, por exemplo, pulou do 64º lugar em 2011 para o 41º lugar em 2012 (ganho de 23 posições) depois de sua associação no estilo "verein" com a Hammonds, do Reino Unido, em 2011. 

A SNR Denton subiu da 74ª posição para a 43ª (ganho de 31 posições) depois da fusão "transatlântica" entre a Sonnenschein Nath e a Rosenthal and Denton Wilde Sapte. A Norton Rose, que já havia pulado de 67ª posição para a 34ª, em 2010, graças a sua associação com a Deacons da Austrália, subiu para a 14ª posição depois de sua associação com a Deneys Reitz da África do Sul, Ovilvy Renault do Canadá e Macleod Dixon. O faturamento combinado da Norton Rose Group em 2012 foi de US$ 1,32 bilhão — aumento de 175% em dois anos.

A flexibilidade da estrutura no estilo "verein" está tornando o modelo no veículo preferencial das bancas para conseguir uma rápida expansão internacional. Os críticos desse modelo afirmam que esse é apenas um recurso que torna muito fácil evitar as dificuldades das decisões de integração de bancas que, em algum ponto, vão expor suas fraquezas institucionais. Mas o sucesso das últimas transações "verein", em termo de impacto material, vem popularizando o modelo e lhe atribuindo credibilidade. 

A advocacia continua dividida sobre a viabilidade de longo prazo dessas associações voluntárias que resultam em múltiplos centros. Os defensores do modelo argumentam, porém, que essa é uma maneira simplificada de se criar marcas genuinamente globais. 

Conheça o ranking das 100 maiores bancas do mundo por desempenho financeiro no último ano fiscal, comparado com o ano anterior.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

"Se o CPC ficar do jeito que está, é melhor não sair"

Por Elton Bezerra e Lívia Scocuglia 
Conjur

No Brasil, a excessiva judicialização dos conflitos vem da omissão do Legislativo. “Os deputados e senadores estão mais interessados em Comissão Parlamentar de Inquérito”, na avaliação da processualista Ada Pellegrini Grinover. Em entrevista à revista Consultor Jurídico, a professora da Faculdade de Direito da USP nascida na Itália não só relembrou a infância como comparou o Judiciário brasileiro ao de países europeus. Segundo ela, a Administração Pública na França, por exemplo, mesmo sem ter a palavra final, resolve as questões de sua competência, satisfatoriamente. No Brasil, “a Administração se omite, o Legislativo não decide e tudo vai parar no Judiciário”.

O cidadão é obrigado a procurar a Justiça, segundo Ada, pela omissão legislativa e pelos vários projetos de lei que esperam vez no Congresso Nacional — isso deixa "temas polêmicos no Brasil", como união homoafetiva e os limites do controle de políticas públicas, nas mãos de juízes, desembargadores e ministros. 
Autora do livro Teoria Geral do Processo, referência nos cursos de Direito, Ada criticou o projeto do novo Código Civil que, para ela, se resume ao aperfeiçoamento do Código de 1973. Poucas questões estão classificadas por ela no grupo de melhorias, a maioria, como a Ação Declaratória Incidental, a Reconvenção, e os Embargos Infringentes, são questões que “ainda não estão boas”. Para ela, se o Código permanecer do jeito que está, “é melhor que não saia”.

Durante a entrevista, foi possível conhecer um pouco da vida da processualista: as fotos de família estão em porta-retratos espalhados pelos móveis e os livros, alinhados na prateleira, ocupam uma grande parede da sala de sua casa. Uma estátua japonesa separa o cômodo em dois ambientes. Na mesa de centro, duas garruchas, um revólver e adagas — lembranças que trouxe da Itália.

Após duas horas de conversa e seis cigarros, Ada se despediu e voltou para os livros, alunos, e aulas. “Eu nunca trabalhei tanto como depois que fui aposentada compulsoriamente. Aliás, ninguém deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos.”  

Leia a entrevista com Ada Pelegrini.

ConJur — Como a senhora vê o novo projeto do Código de Processo Civil?

 Ada Pellegrini — Não se trata de um novo Código de Processo Civil, é, na verdade, um aperfeiçoamento do Código de 1973 com algumas modificações. É claro que um Código novo é mais homogêneo, tem mais harmonia interna, mas eu costumo dizer que nós ainda estamos reformando o Código de 1973, que, por sua vez, tinha reformado o Código de 1939. Então, nada de novo ao sol do Brasil. Se esse Código sair do jeito que está no substitutivo da Câmara dos Deputados, é melhor que não saia. 

ConJur — Por quê?

 Ada Pellegrini — Ainda tem muitos defeitos, muitos erros. Mas a situação política é que está muito confusa na Câmara. O Sérgio Barradas, relator da comissão, que está revendo o projeto de lei na Câmara, é suplente de deputado. Ele já teve de sair do cargo uma vez porque o titular reassumiu a função. Nessa época, ele foi substituído pelo Paulo Teixeira, os dois do PT. O Paulo Teixeira deu uma abertura maior do que o Barradas. Ele ouviu mais especialistas, fez mais audiências públicas. Agora, o Barradas reassumiu, e ele está ligado a um professor de Processo Civil da Bahia, muito bem qualificado, mas que, infelizmente, não consegue trabalhar em equipe. Então, na verdade, o primeiro trabalho que traz o nome do Barradas é um projeto feito por uma só pessoa. 

ConJur — O que foi feito em relação a isso?

 Ada Pellegrini — Houve uma gritaria muito grande dos especialistas. Nós fizemos uma reunião, convocada pelo Barradas e pelo vice relator Paulo Teixeira, em Brasília, e conseguimos corrigir alguns defeitos que tínhamos apontado. Mas não corrigimos tudo. Em parte porque não deu tempo, em parte por causa desse professor fez a redação final — muito personalista. Agora, o relatório final do Barradas foi apresentado, mas não está bom. 

ConJur — Quais são os pontos que não estão bons?

 Ada Pellegrini — Na Câmara, o projeto retomou muito mais coisas do Código de 1973 do que no Senado. Então, diversos institutos que o Senado havia suprimido voltaram. Como exemplo podemos citar a Ação Declaratória Incidental, a Reconvenção, os Embargos Infringentes. Além disso, a Ação Monitória foi reintroduzida, sendo que ela ainda precisa ser melhorada. Ainda há um problema com os honorários advocatícios, causados, em parte pela Fazenda Pública, que desfavorece muito o trabalho do advogado. São várias coisas que ainda queremos melhorar. 

ConJur — O que foi melhorado?

 Ada Pellegrini — A conciliação e a mediação judiciais. Conseguimos reintroduzir a estabilização da Tutela Antecipada — mas se mantém uma terminologia totalmente diferente da tradicional, introduzida, primeiro, pela doutrina, e, depois, pelo Código de 1973. 

ConJur — Pode haver alguma mudança nesse relatório final?

 Ada Pellegrini — Eu não sei o que vai acontecer, porque parece que, de novo, o Barradas vai sair da relatoria. Não sei quando e nem o motivo. Mas está em uma situação de precariedade. E, certamente, não vai dar tempo do relatório final do Barradas, que ainda tem tantos equívocos, ser submetido ao Plenário antes dele sair. Se ele sair, e o Paulo Teixeira reassumir a relatoria, nós teremos um pouco mais de tempo e de espaço para trabalhar. Não acredito que haja uma tramitação que permita a aprovação do substitutivo da Câmara antes da saída do Barradas. Então, retomaria o Paulo Teixeira, e os juristas, penalistas e processualistas estão em contato com ele. Mas, se o projeto for aprovado do jeito que está, vai voltar para o Senado, que, provavelmente, vai retomar muitos pontos que já haviam decidido. Ainda temos um longo caminho pela frente. 

ConJur — A centralização de ações semelhantes em um juiz monocrático é uma solução pontada para resolver o maior número de processos, mas funciona para as ações repetitivas?

 Ada Pellegrini — Conseguimos introduzir essa questão nesse substitutivo do Barradas, em uma tentativa de coletivização do processo. O projeto prevê o incidente para julgar uma causa só e aplicar o julgamento as outras, mas nós queríamos a possibilidade de transformação de ações individuais em uma ação coletiva. Então, nós introduzimos dois dispositivos no novo texto: quando há repetição de diversas ações individuais com o mesmo objeto, o juiz notifica aquele que pode ajuizar uma Ação Civil Pública. Se ele quiser, a Ação Civil Pública vai absorver as ações individuais. E mais, quando se tratar de uma ação individual, que na verdade tem efeitos coletivos, como, por exemplo, nos casos de telefonia, o juiz transforma a ação individual em processo coletivo — já que ele vai ter que atingir da mesma maneira a todos que se encontram na mesma situação jurídica. 

ConJur — O novo Código pode ter mais um livro para tratar sobre os processos coletivos?

 Ada Pellegrini — Ainda há pessoas, principalmente no Poder Judiciário, no Superior Tribunal de Justiça, que gostariam que o Código tivesse mais um livro dedicado aos processos coletivos. Então, [o jurista] Athos Gusmão Carneiro, junto com o deputado Miro Teixeira, deve apresentar um substitutivo ao relatório do Barradas que vai tratar de processos coletivos em um livro separado. Na última reunião que tivemos, prevaleceu a ideia de não tratar todo o processo coletivo no Código de Processo Civil, mas só das técnicas de coletivização das demandas individuais. 

ConJur — A quem caberia transformar a ação individual em ação coletiva?
Ada Pellegrini — Ao juiz, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Atualmente, eles não podem fazer isso porque muda a causa de pedir, muda o pedido e deve haver uma regra expressa. 

ConJur — A mediação deveria ser obrigatória?

 Ada Pellegrini — A tentativa de mediação e a audiência de conciliação devem ser obrigatórias. Assim, a parte tem, pelo menos, a oportunidade de conhecer essas novas técnicas, e pode escolher uma delas. Conseguimos, nessa ultima reunião, que ainda que uma das partes diga que não está interessada na audiência de conciliação, a audiência acontecerá. Mas se as duas partes disserem que não estão interessadas na audiência de conciliação, começa o prazo para defesa. 

ConJur — Quem deveria mediar?

 Ada Pellegrini — O mediador. Nós temos a resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça que instituiu e regulamentou a mediação e a conciliação judiciárias. Elas devem ser mediadas por terceiros facilitadores com capacitação mínima para exercerem a sua função. Não deve ser o juiz, como constava no primeiro projeto do Senado. 

ConJur — Alguns juízes apontam como um fator de insegurança jurídica a qualidade das leis no Brasil. Esse quadro ainda vigora?

 Ada Pellegrini — No direito material, sem dúvida. 

ConJur — E como a senhora vê o projeto de elaboração de leis aqui do Brasil?

 Ada Pellegrini — Seria preferível o que se faz na Itália e na França: uma lei quadro sai do executivo — de especialistas — e fixa as diretrizes principiológicas ou até, em determinadas matérias, mais específicas, que o Congresso tem que levar em conta para legislar. É a lei quadro ou a lei de delegação em que os especialistas do executivo, nem sempre são ótimos, mas pelo menos são considerados especialistas da matéria. 

ConJur — A elaboração desses anteprojetos deveriam vir do Ministério da Justiça, por exemplo?

 Ada Pellegrini — Se for implantado esse processo legislativo, a ideia é que o Ministério da Justiça crie comissões especialistas, e depois o Congresso apenas detalha e especifica. Esse seria o sistema ideal, mas não é o nosso. Qualquer deputado e qualquer senador têm iniciativa para fazer uma proposta de projeto de lei. E com esse cipoal de leis que aparece, uma contradizendo a outra, uma revogando a outra, não dá para saber qual está em vigor. Com a Internet ficou um pouco mais simples. 

ConJur — A Constituição Brasileira completa 24 anos neste mês de outubro. Por que ela não está totalmente em vigor até hoje?

Ada Pellegrini — Ela é muito detalhada. Uma Constituição não pode falar da amamentação, por exemplo. Nós temos uma Constituição tão rica em direitos fundamentais e prestacionais que acaba causando, na prática, um problema. Basta ver a greve no funcionalismo público, pela qual o Supremo Tribunal Federal teve, em um Mandado de Injunção, que diz como tratar o assunto enquanto não vem a lei. E mesmo depois desse julgamento a lei ainda não veio. Por outro lado, o legislativo brasileiro está muito mais interessado atualmente em comissões parlamentares de inquérito do que legislar. Atribuição parlamentar dá mais holofote e visibilidade, e é isso que os nossos deputados e senadores querem. Em terceiro lugar, há, sem dúvida, uma omissão legislativa muito grande. Nos temas polêmicos do Brasil, embora haja diversos projetos de lei no Congresso tentando resolver os assuntos, o Legislativo não legisla união homoafetiva nem limites do controle de política pública. O Judiciário ocupa o lugar que seria do Legislativo, e o STF tem decidido questões que o Legislativo deixou de decidir. E isso acarreta na excessiva judicialização dos conflitos. Tudo vai parar no Poder Judiciário, porque o Legislativo não resolve ou porque a Administração Pública se omite. Em outros países, como na França, tudo relativo a pedidos da área da saúde, por exemplo, é decidido administrativamente. 

ConJur — Na França, são quatro instâncias administrativas antes de chegar no Judiciário. Seria possível seguir um modelo desse no Brasil?

 Ada Pellegrini — Claro. Mas alguém tem que criar... 

ConJur — Na Argentina aprovaram uma lei recente...

 Ada Pellegrini — Mas é preciso criar órgãos que, efetivamente, se interessem pela atuação positiva, que resolvam rapidamente o problema, sem necessidade de ir ao Judiciário. No Brasil, a Administração não se organiza. As agências reguladoras, por exemplo, não fazem o seu papel em beneficio do consumidor. E ele vai ao Judiciário. 

ConJur — A Administração não tem a palavra final, não é?

Ada Pellegrini — A Administração na França e na Argentina também não tem a palavra final, mas, pelo menos, resolve a questão. E quando a questão é resolvida satisfatoriamente e com Justiça, não é preciso recorrer ao Judiciário. No Brasil, os nossos órgãos administrativos, que julgam conflitos entre contribuinte e o fisco, têm uma atuação tão pífia, tão ligada ao executivo, que é necessário ir ao Judiciário para rever a decisão. Não adianta pensar em eliminar sobrecarga dos tribunais, porque é isso que acarreta o excesso de trabalho que os tribunais. Todo mundo é obrigado a ir ao Judiciário, porque a administração não resolve. 

ConJur — A inclusão social e a judicialização dos conflitos está transformando as questões ligadas ao Direito em um assunto quase que popular. O caráter contramajoritário, necessário para ter uma decisão serena, vem sendo exercido pelo Judiciário?

 Ada Pellegrini — Sim. Mas por quanto tempo? Com que efetivo conhecimento dos fatos? O Judiciário tem assumido esse papel. Mas o juiz se encontra diante dos casos sem nenhuma assessoria especifica. Então, ele exerce uma Justiça, que eu chamo de Justiça de misericórdia, para salvar uma vida, talvez, sem nenhum conhecimento mais profundo dos fatos. Não é possível tolher do indivíduo o exercício de seu direito subjetivo individual de pedir remédio, internação hospitalar, ou cirurgia no exterior, e o juiz se encontra diante desses casos sem nenhuma assessoria especifica. Essa decisão dando a uma pessoa aquilo que outra pessoa, nas mesmas condições, não tem, porque não foi ao Judiciário pedir, quebra a igualdade, quebra a universalidade, que é um preceito da política de saúde pública. O juiz se sente completamente perdido. Ele atua. Mas será que está atuando equilibradamente, com Justiça? Será que ele está sabendo qual é o reflexo que a sua decisão vai ter sobre os recursos destinados à saúde para todos? Essa judicialização leva a um estrutura institucional que deve, pelo menos, se preocupar em fornecer ao juiz todos os elementos necessários para que ele possa julgar com justiça, e tentando ao máximo, preservar a igualdade. 

ConJur — O juiz precisa de apoio para lidar com políticas públicas?

 Ada Pellegrini — Por isso fizemos esse anteprojeto de lei que está sendo discutido para o novo processo de cognição mais profunda e de contraditório mais amplo, para que um juiz possa efetivamente intervir em políticas públicas, ou ações individuais que tenham reflexos em políticas públicas, de maneira prudente, ponderada, justa e dando decisões exequíveis. O juiz tem que ser informado, assessorado, consciente do que está fazendo, porque está mexendo em uma política pública que tem que ser universal e igualitária por definição. 

ConJur — Como a senhora vê o fenômeno do ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa ser eleito pela mídia, pela população em geral, como um herói nacional?

 Ada Pellegrini — A mídia pré-julgou. 

ConJur — No caso do mensalão?

 Ada Pellegrini — A mídia sempre pré-julga. E no caso do mensalão, pré-julgou. A pessoa que corresponde às expectativas da mídia passa a ser o herói nacional e quem não corresponde passa a ser o vilão. Esse é um problema muito sério, que se vê, sobretudo, em casos criminais. O mensalão é um caso criminal, de pressão da mídia que forma a opinião pública. Não é a pressão da opinião pública, porque a opinião pública é manejada pela mídia. Eu não estou querendo defender a posição do relator ou do revisor, porque eu não conheço o processo. Mas nos casos criminais do Brasil, o que é proibido em outros países, a mídia condena sem processo e dificilmente absolve. As interceptações telefônicas, por exemplo, devem correr em segredo de Justiça, mas sai tudo no jornal! Isso é crime. Mas quem é que forneceu a informação? Quem tem interesse em fornecer a informação? Ninguém nunca foi atrás. 

ConJur — Nesses casos a imprensa deveria ser responsabilizada pelo vazamento?

Ada Pellegrini — Sim. Mas por enquanto não é. A mídia pode, inclusive, esconder a fonte. 

ConJur — O sigilo de fonte é garantido pela Constituição...

 Ada Pellegrini — Mas sigilo da fonte em um crime, que é violar a interceptação telefônica? Isso é crime. A imprensa deveria se auto-censurar. Quem tem interesse de vazar a informação? A defesa certamente não. O interesse é de um órgão público. Ou é a Polícia, ou é o Ministério Público, ou o técnico. Não é um país sério. A conduta é criminalizada, a imprensa não se preocupa com isso, porque não tem nem previsão de criminalização. Ninguém vai atrás de quem fez. Isso me incomoda muito. A interceptação é publicada, com perguntas e respostas que precisam ser interpretadas, e logo o sujeito é condenado e preso. 

ConJur — Há uma discussão sobre o uso de provas indiciárias, principalmente com o mensalão. As provas indiciárias estão sendo bem usadas no Brasil? Essa decisão do Supremo no mensalão pode modificar o entendimento que se tinha até então?

 Ada Pellegrini — A prova indiciária nada mais é do que uma técnica pela qual e possível provar um fato — não por meio de uma prova indireta, mas por uma ilação. Há uma série de regras que devem ser observadas para que o indício seja considerado apto efetivamente a provar o fato. É uma questão técnica. Sem conhecer o processo do mensalão não posso dizer se a técnica do aproveitamento da prova indiciária está sendo bem utilizada. 

ConJur — Mas a prova indiciária é valida?

 Ada Pellegrini — Claro. Quanto mais próximo for o fato a ser provado do fato que é o indicio, mais sólida é a conclusão a que se pode chegar. Mas normalmente, deve haver vários indícios, todos convergindo para a mesma persuasão lógica. Se a causa e efeito forem bem construídos, você pode usar prova indiciária. 

ConJur — O Supremo restringiu o uso de Habeas Corpus substitutivo do Recurso Ordinário. A senhora concorda?

 Ada Pellegrini — Está certo. O Habeas Corpus está sendo utilizado para tudo. É impressionante o que a Defensoria Pública, em todo Brasil, em vez de recorrer, entra com Habeas Corpus. O Habeas Corpus é um remédio Constitucional destinado a preservar a liberdade ainda que indiretamente. Quando o processo penal, por exemplo, não tem a aparência do direito então pode entrar com Habeas Corpus. Entrar com Habeas Corpus no lugar de recurso é uma aberração. 

ConJur — O papel da jurisprudência está sendo reforçado nesse novo Código de Processo Civil?

 Ada Pellegrini — Esse novo Código não traz praticamente nada de novo em relação a jurisprudência. Mas vem sendo reforçada por técnicas, como a súmula vinculante, a súmula impeditiva de recursos, o caso piloto. O papel da jurisprudência no Brasil não assumiu ainda a posição igual nos países de Commom Law, mas hoje podemos dizer que, também no Brasil, a jurisprudência não é só interpretação, mas também fonte do Direito. 

ConJur — Temos um sistema misto de Commom Law e Civil Law?

 Ada Pellegrini — Cada vez mais a Commom Law se aproxima. Até hoje, cabe-se perguntar se vale a pena distinguir como radicalmente diferentes o sistema de Commom Law e de Civil Law. 

ConJur — Isso é bom?

 Ada Pellegrini — Sim. Eu acredito muito na vitalização do Direito por intermédio da jurisprudência. Mas temos que ter na jurisprudência uma segurança jurídica que não ainda temos. 

ConJur — O que falta?

 Ada Pellegrini — Coerência nos tribunais para que não haja decisões contraditórias do mesmo tribunal durante anos, principalmente dos tribunais superiores. O STF não pode mudar, de repente, toda a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como aconteceu com o Cofins. Isso dá uma grande insegurança jurídica. A jurisprudência também necessita ser mais coerente internamente, a técnica da uniformização da jurisprudência é pouco usada. 

ConJur — A súmula vinculante vem sendo bem aplicada no Brasil?

 Ada Pellegrini — Não. Invoca-se a súmula vinculante para casos completamente diferentes, sem seguir o caminho lógico, razoável, que levou à elaboração daquela súmula, e a que fatos aquela súmula pode aplicar-se e a que fatos não deve aplicar-se. 

ConJur — Como a senhora vê a composição do Supremo, a aposentadoria compulsória e o fato de ter uma troca tão grande de ministros em um curto espaço de tempo?

 Ada Pellegrini — Eu não gosto do sistema de escolha brasileiro de ministros do Supremo, porque é indicação do presidente da República. Já viu algum candidato ser reprovado na sabatina do Senado? 

ConJur — Há candidatos que estão entrando sem notável saber jurídico?

 Ada Pellegrini — Com certeza. 

ConJur — E a que a senhora atribui isso?

 Ada Pellegrini — O apadrinhamento do Executivo e fechar de olhos do Legislativo. O Senado não vai a fundo, não examina essa questão, não sei se ministro do Supremo deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos. Eu nunca trabalhei tanto como depois que fui aposentada compulsoriamente. Aliás, ninguém deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos. Teria que fazer uma prova de aptidão, física e mental. A aposentadoria se faz mais para renovar os tribunais, do que por uma presunção relativa de incapacidade. 

ConJur — Os ministros deveriam passar por uma sabatina pública?

 Ada Pellegrini — Poderia ser como acontece nos tribunais, até no Superior Tribunal de Justiça: primeiro os ministros são indicados — não pela Ordem dos Advogados e nem pelo Ministério Público, porque aí  vamos ter o que está acontecendo nas indicações, nas listas sêxtuplas desses órgãos, que é um absurdo. Representantes da sociedade científica organizada poderiam, pelo menos, fazer a primeira indicação para o presidente da República. Deixar mais participativa a nossa sociedade organizada. 

ConJur — Isso, de certa forma, não gera efeito por meio dos contatos que a própria sociedade científica tem no Legislativo e no Executivo? Ou teria que ser um processo formal?

 Ada Pellegrini — Não. O presidente da República escolhe quem quer, quem mais interessa e pode ser favorável ao governo. Ele não vai atrás da sociedade científica. Pior é que é o governo, não é o Estado.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Joaquim da FGV avalia Joaquim do STF


Trechos das previsões de Joaquim Falcão, professor da FGV Direito Rio, sobre como o ministro Joaquim Barbosa deverá exercer “tanto poder e influência” como presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, em análise publicada no “O Globo Online“: 

(…)
É negro, num país mestiço, de elite branca. Como Lula e Eliana Calmon comunica-se diretamente com o povo. Às vezes por palavras, quase sempre por sintonia de sentimentos e atitudes. Assim ultrapassa as críticas a seu temperamento.

(…)
Não leva insinuações para casa, que digam os ministros Gilmar, Peluso e Lewandowski. Não provoca, mas reage. Às vezes exagera na reação.

(…)
Sabe o valor da democracia. Foi visiting scholar em Los Angeles e na Universidade de Columbia, em Nova York.

(…)
Simboliza a necessidade de igualdade do negro em nossa sociedade. Conquistada não por assistencialismos, filantropismo ou cordialidades. Mas por mérito. É assim sua experiência de vida.

(…)
O desempenho de Barbosa no mensalão consolida o valor do mérito pessoal, muito além das raças, e mesmo assim simboliza a injustiça da discriminação do negro. Moldará sua presidência

Decano do Supremo julga seu ex-companheiro de pensão

Em julho, o estelionatário Sérgio Augusto Coimbra Vial foi preso mais uma vez pela polícia carioca. Não aproveitou a oportunidade que lhe dera o ministro Celso de Mello, decano do STF, que há cinco anos, em habeas corpus do qual se orgulha, anulou sentença que condenara Vial a dez anos de prisão por clonar cartões de crédito.

O ministro sustentou que as provas foram obtidas ilegalmente porque os agentes entraram à força no apartamento onde Vial se hospedava, na Zona Sul do Rio, para colher uma máquina de clonagem, chamada de ´chupa-cabra´, sem autorização judicial.

Para chegar à conclusão de que a prova era ilícita por violação de domicílio, protegido pelo artigo 5º da Constituição, Mello se inspirou no conturbado ano de 1968, quando era estudante e morava na Pensão do Abelardo, na Rua Condessa São Joaquim, no Bexiga (SP). Até hoje, o ministro se lembra da tensão que sofria quando a ´república´ era invadida por agentes do Dops atrás de agitadores do movimento estudantil.

Se Celso de Mello não teve o quarto invadido, embora tenha sido obrigado a permanecer de pé, tenso, até o fim da batida, um vizinho não teve a mesma sorte. José Dirceu, outro hospede de Abelardo, já fazia parte da lista negra da repressão.

O interessante e histórico registro é feito pelo jornal O Globo, em sua edição de hoje (10), ao mencionar que o destino volta, hoje, a confrontar Celso de Mello com a trajetória de Zé Dirceu. O apreciado texto é do jornalista Chico Otávio.

Passados 44 anos, Mello é um dos dez juízes com o poder de levar para a prisão o ex-vizinho, acusado de corrupção ativa e formação de quadrilha. Ele foi um dos responsáveis para que esse julgamento acontecesse, ao votar em 2007 pelo acolhimento da denúncia.

Quatro meses mais velho do que Dirceu, o ministro Celso de Mello chegou à pensão em 1964 após uma temporada de estudos nos Estados Unidos. De uma família de Tatuí (a 131 quilômetros da capital), mudou-se para São Paulo aos 18 anos e se inscreveu no cursinho Toloza, na Rua São Bento, porque queria entrar para a Faculdade de Direito da USP. Seu projeto não diferia dos sonhos de Dirceu, que chegara pouco antes, também do interior (a mineira Passa-Quatro), queria estudar Direito e também se abrigara no Abelardo.

Mello, que passou  cinco anos na pensão, descreve o quatro, dividido com outro hóspede, como “um cubículo com dois catres”. Dirceu e Mello viviam em alas diferentes e se conheceram nas salas do cursinho Toloza. O futuro presidente do PT trabalhava como office-boy.

"Naquele mesmo dia, nos encontramos na pensão e conversamos" - recorda-se Mello.

As vidas deles seguiriam rumos distintos em 1965, quando Mello ingressou na USP e Dirceu, na PUC-SP. O futuro ministro do STF priorizava os estudos, e o vizinho de pensão, a carreira de líder estudantil. O calor das ruas logo bateria à porte do Abelardo.

No livro “O que fizemos de nós”, que complementa a obra “1968: o ano que não terminou”, de Zuenir Ventura, Mello descreveu o trauma causado pelas visitas noturnas dos agentes do Dops. Mesmo tendo passado ao largo das agitações, Celso de Mello contou que extraiu uma ´dura lição’: "Uma Constituição sob uma ordem autocrática não vale absolutamente nada. A polícia e os organismos militares detinham poderes totais sobre os indivíduos”.

Em 1969, enquanto Mello diplomava-se, Dirceu ia para o exílio no México, em troca da libertação do embaixador norte-americano Charles Elbrick.

Para Celso de Mello, o regime militar representou muito mais do que o conceito abstrato, meramente teórico, estudado nos livros de História e de ciência política: “Enfrentamos uma época realmente dura, em que pessoas eram arbitrariamente privadas de seus direitos”, relatou a Zuenir. Tal experiência alavancou a vocação de Mello pela preservação dos princípios constitucionais, como o direito a um julgamento justo, valor agora em jogo no julgamento do ex-vizinho dos temos duros do Abelardo.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Honorários advocatícios em valores irrisórios

Existem muitos  juízes que costuma deferir honorários advocatícios em valores irrisórios e não dá a mínima bola para o trabalho realizado pelo profissional. Mas o ministro Humberto Martins, da Segunda Turma do STJ, acaba de passar um pito nesse grupo. 

O ministro lembra que, de acordo com a jurisprudência do STJ, a fixação de verba honorária deve ser feita com base em critérios que levem em consideração a responsabilidade assumida pelos advogados, sob pena de violação do princípio da justa remuneração do trabalho profissional.

É preciso ainda, segundo o ministro, considerar o trabalho e o tempo exigido para o serviço.E passando do entendimento à prática, elevou os honorários de um profissional fixados em R$ 15 mil para R$ 300 mil. 

Olhem a discrepância absurda entre a primeira, a segunda instâncias e Brasília. Pelo juiz, R$ 500,00; pelos desembargadores, R$ 15 mil, e pelos ministros, R$ 300 mil. É ou não é uma falta de consideração com o trabalho dos advogados, em boa hora corrigido pelo STJ?


segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Em defesa dos advogados


O STJ passou a ser o justiceiro em defesa dos advogados que por algum motivo oculto não têm o trabalho profissional reconhecido pelas primeira e segunda instâncias. Adoram desvalorizar o serviço do advogado. Mas o STJ está de prontidão para acabar com essas acintosas aberrações. 

A Terceira Turma do STJ aumentou de R$ 800 para R$ 20 mil os honorários fixados a advogados de uma ação envolvendo indenização, à época, de R$ 894 mil – valor que, atualizado, passa de R$ 1 milhão. O tribunal havia considerado o valor dos honorários adequado, porque a decisão interlocutória conseguida pelos advogados apenas impediu a desconsideração da personalidade jurídica da empresa.

“Não se ignora o fato de que, no particular, o trabalho executado pelo advogado em prol dos recorrentes foi reduzido, limitando-se à inclusão, na própria contestação da empresa ré, de preliminar de ilegitimidade passiva”, considerou a ministra Nancy Andrighi. “Entretanto, o trabalho do advogado não se restringe à elaboração das peças processuais”, completou.

Para a ministra, cabem ao advogado “diversas outras providências, como realizar reuniões com o cliente, analisar a documentação apresentada na petição inicial e aquela que irá instruir a defesa, acompanhar o andamento do processo, manter entendimentos com os patronos da parte adversa etc.” 

“Ademais, há de se levar em consideração a responsabilidade assumida pelo advogado ao aceitar o patrocínio de uma ação, sobretudo aquelas que possuam significativo conteúdo econômico. Ainda que o seu dever seja de meio e não de fim, o advogado responderá pelos danos que eventualmente causar ao cliente”, acrescentou a ministra