segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Sociedade tolera caos no sistema carcerário por achar que preso deve sofrer, diz juiz

Presos decaptados, bebendo água de açudes que recebem esgoto, sem atendimento médico, em celas superlotadas. Esse cenário de filme de terror, comum no sistema carcerário brasileiro, tem sido revelado pelos mutirões carcerários e inspeções realizadas pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) ao longo dos últimos três anos.

Em entrevista à repórter Luciana Bareti Nunes, do site Última Instância, o juiz Luciano Losekann, coordenador do DMF (Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário), afirma que desde as primeiras vistorias do CNJ houve avanços por parte dos governos estaduais, mas ainda estamos longe de garantir tratamento adequado e respeito aos direitos dos presos. “Nós estamos tratando as pessoas privadas de liberdade de uma forma indigna. Talvez seja necessário convocar a lei protetora dos animais para que dêmos efetividade ao que diz a Constituição e as leis sobre o tratamento de pessoas”.

Segundo Losekann, parte da culpa pela situação caótica do sistema prisional pode ser creditada à própria sociedade, que tolera as violações de direitos humanos nos presídios, por achar que os presos devem sofrer como punição pelos crimes cometidos. "Enquanto a sociedade mantiver esse sentimento de vingança, pouca coisa pode ser feita. As pessoas não se dão conta de que qualquer um de nós pode estar no sistema prisional. Muitas pessoas mudam a ideia que tinham do sistema prisional quando tem um amigo, ou parente preso."

Leia a seguir a íntegra da entrevista com Luciano Losekann:

Há quase três anos do início dos mutirões carcerários e das inspeções do CNJ, é possível dizer que a situação carcerária no país mudou? O Conselho já conhece as causas que levam à superlotações e violações de direitos humanos?

 Luciano Losekann - Em parte sim, no sentido de fazer com que o Poder Executivo dos Estados - que são os tradicionais gestores do sistema prisional - começem a ter uma conduta diferente em relação ao setor penitenciário, fazendo investimentos para que haja melhorias. País afora, temos firmado com os Estados termos de compromisso para aprimorar o sistema carcerário, fortalecê-lo, e, sobretudo, torná-lo mais humano. Este é o grande problema que existe no Brasil hoje em dia: a falta de dignidade do sistema prisional nacional.

Qual o saldo da atuação do CNJ até agora nos mutirões e inspeções?

Luciano Losekann - No âmbito do próprio Poder Judiciário, os tribunais estaduais começaram ver especialmente a parte de execução penal de uma forma diferente, começaram a dar importância a segmentos da jurisdição. Em muitos Estados, antes dos mutirões, não se dava a mínima para área de execução penal. Hoje, a realidade é distinta da de três anos atrás, juízes vêm sendo designados especialmente para atuar nessas varas. Há também programas visando a virtualização dos processos, o que dá maior celeridade. Ou seja, há uma preocupação além dos projetos como o Começar de Novo, que começa a ser mais desenvolvido nos tribunais de justiça em parceria com o CNJ.

Como o CNJ tem agido com a falta de acompanhamento das condições penitenciárias por parte dos juízes de execução penal?

Luciano Losekann - O CNJ, por meio de resoluções, tem obrigado determinadas condutas. Como exemplo, a Resolução 108 obrigou que os magistrados, ao expedirem o alvará de soltura, se certifiquem se esse alvará foi executado dentro do prazo. Hoje, o magistrado poderá ser responsabilizado se esse alvará não for cumprido no prazo estipulado. De outro lado, as visitas aos estabelecimentos são recentemente cobradas. Antes mesmo dos mutirões, verificamos se o juiz é conhecido da população carcerária e se ele visita ou não o presídio. Com isso, temos cobrado muito das corregedorias, que por sua vez cobram do magistrado esse tipo de atitude. O que não existe, ou não temos visto, são juízes de execução penal sensíveis e que estejam realmente preocupados com a execução penal. Muitas vezes o juiz criminal responsável não tem noção de como é a cadeia para qual ele vai mandar aquela pessoa. Esse vínculo nós temos que aprimorar.

O Brasil atingiu a marca de meio milhão de presos. O senhor vê relação direta entre o aumento da população carcerária e as péssimas condições encontradas em sistemas prisionais?

Luciano Losekann - Esse aumento da população prisional decorre de um lado, do tipo de legislação que permite um grande número de decretos de prisões provisórias. Em alguns Estados da federação, a prisão se torna regra e não exceção - quando, na verdade, a liberdade é a regra e a prisão é exceção. Ela tem que ser muito bem fundamentada e reservada para não vulgarizarmos o sentido e alcance da prisão provisória. Hoje, no Brasil, ela é muito utilizada como antecipação de pena, o que é inconstitucional. Mas a questão do aumento da população carcerária é justificada por um outro lado: o aumento da criminalidade violenta do Brasil. Nós falhamos, há 30, 40 anos atrás, em termos de políticas sociais de educação no Brasil. Isso reflete diretamente nos índices de criminalidade, porque com uma população inculta, que não tem meios de trabalho regular, acaba sendo tentada ou levada para a criminalidade. Muitas pessoas não precisariam estar no sistema prisional, mas a falta de políticas sociais públicas estimulam a criminalidade. Outro fator importante para o aumento da população carcerária no Brasil se deve ao aumento do tráfico de drogas, que cresceu assustadoramente no  país. Não há controle por parte das autoridades públicas e não há um efetivo na política antidrogas, que é extremamente falha no país.

O sr. acredita que existe tolerância na sociedade às violações de direitos humanos dos presos?

Luciano Losekann - Enquanto esse sistema prisional for desumanizado, não possuir o mínimo de dignidade, ele só gera mais violência. E essa violência retorna sobre a própria sociedade, que, violentada, pensa que o preso deve sofrer, que essa é a função da pena porque quanto mais o preso sofrer, mais vai aprender. Quando na verdade é o contrário, a prisão não reeduca ninguém. Enquanto a sociedade mantiver esse sentimento de vingança, pouca coisa pode ser feita. As pessoas não se dão conta de que qualquer um de nós pode estar no sistema prisional. Muitas pessoas mudam a ideia que tinham do sistema prisional quando têm um amigo ou parente preso. A partir daí elas começam a perceber que a ideia cultivada do sistema prisional estava equivocada.

O intuito da inspeção é identificar os problemas do sistema carcerário e apontar soluções. O sr. pode apontar alguns resultados? Qual é o balanço até o momento?

Luciano Losekann - Em cada tribunal de justiça temos um grupo de monitoramento do sistema carcerário, isso faz com que tenhamos uma interlocução constante com os tribunais de justiça do estado e com grupos que fazem controle da execução penal. Muitos problemas temos encontrados por ter esta comunicação.Temos conseguido um comprometimento maior dos executivos dos estados, são eles que criam vagas e constroem novas unidades. Muitos estados sentem a “pressão” do CNJ no sentido de melhoria do sistema. Por que nenhum estado gosta de receber do CNJ a notificação de que seu sistema é irregular, então isso tem sido muito positivo. A exemplo o mutirão de Mato Grosso onde o governo criou vagas no regime semi-aberto o que não existia no estado assim como se comprometeu a criar novas vagas no regime semi-aberto e  aberto. O Espírito Santo depois da presença do CNJ em 2009, no primeiro mutirão, o poder judiciário e poder executivo fizeram grandes esforços para melhorar o sistema prisional.  
  
As inspeções têm denunciados abusos, negligências e descasos. Quais medidas estão sendo tomadas em casos específicos como a falta de lugares para dormir, falta de limpeza, maus tratos com os detentos?

Luciano Losekann - São encaminhados ofícios aos governadores do Estado, aos secretários da penitenciárias, colocando a situação e, solicitando urgentes providências para que o tipo de negligência  ou descaso sejam resolvidos  e para que na próxima investigação a conversa com os governadores não seja necessária. Isso é uma forma de expor o Estado, afinal o governo não gosta que a mídia saiba que seu sistema prisional não é nada bom. Nossa conversa com os governadores do Estado e secretários de administração penitenciária é constante para que haja melhorias. Até mesmo com a União, que possui e destina recursos, o diálogo é constante, na medida que deve haver por parte do governo federal uma destinação de verbas para construção de mais unidades prisionais. Embora seja indispensável que o sujeito seja trabalhado junto a psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras. Não basta construir espaço físico, tem de ter tratamento penal.

Hoje, o déficit prisional chega a cerca de 400 novos presídios. Como enfrentar as superlotações uma vez que presídios não são construídos da noite para o dia?

Luciano Losekann - Hoje teriam que ser 398 presídios com 500 vagas. Isso é um investimento bárbaro! O que precisamos é repensar o instituto da prisão. A prisão deve ser excepcional. Nos casos em que temos de ter alguma cautela sobre a pessoa que cometeu o delito, ao invés da prisão podemos usar mecanismos bem modernos de fiscalização dessa pessoa. Ao invés de decretar a prisão, posso ter monitoramento eletrônico antes mesmo da sentença final, ou seja, durante o período em que  a pessoa está recorrendo ao processo. Em casos menos graves posso ter o monitoramente cautelar proclamado e deferido durante o tempo que a pessoa está respondendo ao processo. Já está tramitando no congresso nacional o projeto do novo CPP (Código de Processo Penal) e nele está contemplada, ainda de forma tímida, a possibilidade de monitoramento eletrônico para as prisões cautelares. Isso vai ser um avanço. Esse meio é menos danoso ao indivíduo e reserva muito mais os interesses da sociedade.

Em muitas inspeções, ficou clara a má administração das prisões. Quais medidas estão sendo tomadas com relação à direção dos presídios e à obrigação dos estados?

Luciano Losekann - Existe muita corrupção no sistema prisional e o Estado não possui o controle  das unidades prisionais. Quem manda no interior das prisões são os presos, assim como ocorre hoje no Rio de Janeiro, onde o Estado tenta recuperar o controle. Isso revela o descaso e uma situação inadmissível. As políticas ressocializadoras que o Estado deve impor no interior dos presídios não vêm acontecendo em boa parte do país. No caso do Maranhão, onde os presos foram decaptados, o próprio presidente do STF e do CNJ, Cezar Peluso, enviou à governadora do Estado um ofício solicitando urgentes providências para melhoria do sistema prisional maranhense. A morte do preso é uma situação degradante de violência que não pode se repetir. Nós estamos tratando as pessoas privadas de liberdade de uma forma indigna. Talvez seja necessário convocar a lei protetora dos animais para que dêmos efetividade ao que diz a Constituição e as leis sobre o tratamento de pessoas. 

Elite brasileira não quer ser investigada

A 18ª edição da revista “Artigo 5°”, da Associação Cultural Artigo 5° dos Delegados da Polícia Federal pela Democracia, já pode ser acessada no site www.revistaartigo5.org.br. A publicação traz artigos de Fábio Konder Comparato e Luiz Flávio Borges D’Urso, além de uma entrevista com Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, procurador da República de São Paulo. “A elite brasileira não que ser investigada, processada ou incomodada de qualquer forma, não importa o que tenha feito”, diz ele na entrevista.

Na entrevista, o procurador explica porque considera que a atuação coordenada da Polícia com o Ministério Público é a melhor solução para a sociedade. Segundo Gonçalves, “quando brigamos, a criminalidade sorri”.

A 18ª edição da “Artigo 5°” também trata dos cartões corporativos, dos casos de responsabilidade civil das empresas que controlam os sistemas de Zona Azul, dos novos itens de segurança das certidões públicas, do caso Battisti, e das preocupações e medos dos brasileiros com corrupção, assassinato, Polícia Civil, Militar, Municipal e Federal.

O presidente da OAB de São Paulo, Luiz Flávio Borges D’Urso, assina um artigo contra a redução do número de recursos na Justiça em que defende que “os recursos são salvaguardas dos cidadãos. Ao invés de se diminuir recursos, se deveria diminuir o tempo para julgá-los”. O delegado da PF, Bruno Titz de Rezende também se manifesta contra o Projeto de Lei 354/2009, que concede incentivos fiscais e extingue a punibilidade de alguns delitos para estimular a repatriação e regularização de bens e valores localizados nos exterior e não declarados às autoridades brasileiras.

Fábio Konder Comparato, membro de Conselho de honra da revista, escreve um artigo em que critica o novo ministro das comunicações, Paulo Bernardo: “Ao que parece, o governo da presidente Dilma Rousseff considera sem importância as ações de inconstitucionalidade por omissão, já propostas no Supremo Tribunal federal, para exigir que o Congresso Nacional vote uma legislação regulamentadora de vários dispositivos constitucionais sobre comunicação social, ações essas que tenho a honra de patrocinar como advogado”.

No texto “Polícia Federal sobre o pé da ditadura”, a publicação foca na entidade e questiona o processo de escolha do diretor-geral da PF, que é o mesmo da época da ditadura militar. E, ainda, indaga “se a instituição mudou tanto porque não mudou em quase nada? Foi a polícia da ditadura acusada pelo PT de ser a polícia de Fernando Henrique Cardoso, e que depois passou a ser tratada como a polícia do presidente lula. Longe, portanto, de ser a polícia da sociedade brasileira”. (Conjur)

domingo, 27 de fevereiro de 2011

TJMA nega liminar contra honorários da PGE

O Plenário do Tribunal de Justiça do Maranhão negou medida cautelar pedida pelo Ministério Público do estado na Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o dispositivo da Lei Orgânica da Procuradoria-Geral do estado, que permite aos procuradores receberem honorários de sucumbência.

O artigo 91 da Lei Complementar Estadual 20/94, questionado na ação, prevê: "os honorários advocatícios devidos em qualquer feito judicial a Fazenda Pública, serão destinados à Procuradoria-Geral do Estado para aplicação na Procuradoria de Estudos, Documentação e Divulgação Jurídica, na forma disciplinada por Decreto do Poder Executivo".

Apesar de a maioria dos desembargadores ter acompanhado o relator para deferir parcialmente o pedido, nove votaram contra. Para a concessão da medida cautelar, de acordo com o Regimento Interno da corte, seriam necessários 13 votos.

O relator, desembargador Cleones Cunha, votou pela concessão parcial da medida cautelar, limitando o valor dos honorários ao teto constitucional, de 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Contra o posicionamento do relator, o desembargador Paulo Velten negou totalmente o pedido cautelar, por entender que o artigo questionado tem essa redação desde 2003, com a Lei 65, e assim, os requisitos de urgência ou risco de dano não existem no caso.

Concordando com a Procuradoria-Geral, o desembargador Marcelo Carvalho entendeu que os honorários advocatícios de sucumbência não são sujeitos às normas do dinheiro público porque não fazem parte de receitas orçamentárias e são direito autônomo dos advogados, mesmo daqueles que trabalham para o Poder Público. Por ser verba particular, não podem ser computados para efeito de limitação ao teto constitucional.

Segundo os promotores, os procuradores não têm direito aos honorários sucumbenciais, já que a Constituição Federal determina que eles sejam remunerados exclusivamente por meio de subsídio, sendo vedado qualquer acréscimo remuneratório. Além disso, alegam que com os honorários, os procuradores acabam por receber mais do que o teto estabelecido pelo artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal.

A OAB-MA apoia os promotores, e na última segunda-feira (21/2), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil decidiu ingressar como amicus curiae na ADI. A decisão foi votada e aprovada por unanimidade durante a sessão plenária da entidade, realizada por proposição do conselheiro federal pelo Maranhão, Ulisses César Martins de Sousa. O presidente da OAB, Ophir Cavalcante, afirmou que essa é uma das lutas históricas da entidade.

Segundo o conselheiro federal da OAB pelo Maranhão, Ulisses César Martins de Sousa, que propôs a participação da OAB, a entidade pretende defender o direito dos advogados de receberem os honorários advocatícios, assegurados pelo artigo 23 do Estatuto da OAB (Lei 8.906/1994), que não distingue entre advogados públicos ou privados, ao determinar que: "os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor".

Ainda há um espírito inquisitório no processo

Em um encontro com um grupo de juízes canadenses, realizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o desembargador Paulo Rangel não poupou críticas à maneira como os operadores do Direito ainda resistem em colocar a Constituição da República acima do Código de Processo Penal. O CPP é de 1941 e não abarca uma série de garantias previstas no texto constitucional.

Com a Constituição de 1988, a estrutura passou a ser acusatória. “O titular exclusivo da Ação Penal no Brasil é o Ministério Público”, disse. Com isso, a Constituição afastou o juiz da fase pré-processual. “A Constituição normatiza garantias e direitos fundamentais. Mas o tribunal, através de suas decisões, ainda não os efetivou.”

Segundo Rangel, ainda há um espírito inquisitório no processo. Ele afirmou que o tribunal tem mantido a desclassificação de crimes que altera o objeto do processo. “O réu é acusado de um fato e condenado por outro”, diz. O desembargador também disse que há uma ideia errônea de que a Constituição trouxe muitos direitos para bandidos. A defesa do direito do outro, lembrou, é a defesa do seu próprio direito.

“Nós nos preocupamos demais com coisa de menos”, constata. Rangel afirmou que o tribunal ainda discute se cabe regime aberto para condenado por tráfico. “O Supremo Tribunal Federal, nossa Corte Constitucional, diz que abacaxi é fruta. O juiz, por não concordar, diz que é legume”, exemplificou de forma didática. A consequência disso, observa o desembargador, é que quem tem condições financeiras para recorrer aos tribunais superiores, recorre; quem não tem, continua preso.

Se existe uma hierarquia, diz, mesmo que não se concorde com o entendimento pacificado nas cortes superiores, não tem sentido decidir em sentido oposto. Isso cria uma Justiça de classe: uma para ricos e outra para pobres, afirma.
Outra crítica é a perda de tempo em discussões infrutíferas, como o de pena-multa. “Ninguém paga pena-multa”, diz. Se são 60 ou 65, tanto faz. Mas, às vezes, são jogados fora 30 minutos de discussão para chegar à conclusão.

Rangel também falou da reforma do Código de Processo Penal, em gestação no Congresso, que prevê acordo entre acusação e acusado. Ele entende que as pessoas passarão a aceitar o acordo para não ter de enfrentar todo o processo. O resultado será pessoas inocentes cumprindo pena na cadeia. Ele esclareceu não ser contra a acordos. Mas para Rangel é preciso equilíbrio, inclusive, do órgão de onde ele mesmo veio: o Ministério Público.

O MP, disse, tem uma postura muito “xiita” quando o assunto envolve matéria penal. Querem exercer a função punitiva e, ainda, há operadores que acreditam que vão encontrar “a verdade” no processo. Também criticou o fato de o juiz ir atrás das provas, papel que cabe ao Ministério Público.

“O réu não é o juiz, não é o promotor. Mas, quando o réu é um de nós, o referencial muda”, disse o desembargador, chamando atenção para a mudança de mentalidade quando a pessoa passa, por algum motivo, a sentir na pele a situação de réu. “Não advogo a impunidade. Eu defendo a efetivação das garantias, não importa de quem.” (Conjur/Marina Ito)

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Bacabal:promotores se ausentam da cidade

A procuradora-geral de Justiça, Fátima Travassos, esteve em Bacabal dias atrás, acompanhanda do secretário de segurança, Aluísio Mendes, para conhecer a carceragem da delegacia do 1º DP, e o local onde será construído o presídio estadual.

Durante uma audiência na Câmara Municipal, a procuradora ao ser inquirida pela vereadora Liduína Tavares (PTB), disse não ter conhecimento de que os Promotores de Justiça se ausentem da cidade. A vereadora Liduína cobrou um maior empenho dos promotores e que, principalmente, cumpram com a obrigação de dar expediente ordinário na promotoria.

“Senhora procuradora, se a senhora não sabe, aqui nós sabemos que os promotores dão o expediente TQQ, ou seja, terça, quarta e quinta-feira”, acentuou a vereadora para solicitar que a Procuradora buscasse se informar.

O posicionamento da vereadora Liduína durante o evento na Câmara foi decisivo para que a procuradora Fátima Travassos alterasse a sua programação. Ela deixou de acompanhar a comitiva e se dirigiu para a sede das promotorias a fim de constatar como anda o funcionamento do órgão.

"Há muitas causas populares nas promotorias. O povo precisa de Justiça e quem tem o papel de promover essa justiça são as Promotorias, por isso cobrei o empenho da senhora procuradora para que verifique a real situação e tome uma providência" –acentuou a vereadora ao final do evento.

A 2ª Promotoria está sem promotor titular. No início do ano o promotor Agamenon Batista saiu de férias e só deve retornar em novembro, já que tinha férias não-gozadas e licenças. Causas relacionadas a Saúde, Educação, Meio Ambiente, Direitos do Cidadão e Direitos do Idoso, são resolvidas na 2ª Promotoria.

As informações são do radialista Louremar Fernandes, da Rádio Mirante FM de Bacabal

OAB pede que Brasil respeite decisão da Corte Internacional

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, enviou um ofício à presidente da República, Dilma Rousseff, em que pede o cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que, ao julgar o caso Gomes Lund, em novembro de 2010, condenou o Brasil a promover medidas de promoção da verdade e da justiça em relação às graves violações aos direitos humanos cometidas por agentes públicos durante a ditadura militar no país.

No ofício, a OAB observou que o Brasil aderiu, voluntariamente, à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e que, por isso, as decisões da Corte são de cumprimento obrigatório e não precisam de revalidação interna, conforme o artigo 68 do Pacto de São José da Costa Rica, que determina que: "o eventual descumprimento de quaisquer das determinações da sentença da Corte representará um retrocesso sem precedentes na evolução dos direitos humanos no Brasil e nas Américas".

Quanto à decisão do Supremo Tribunal Federal na APDF 153, de que como os crimes ocorridos na ditadura não foram de tortura, eles estariam prescritos, a OAB afirma que ela não é é empecilho ao cumprimento da decisão da Corte, porque "cada um desses tribunais possui competências próprias, e suas decisões devem ser aplicadas nos respectivos limites. O respeito à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma obrigação também do Poder Judiciário brasileiro".

OAB libera advogados de usar paletó e gravata

A exemplo da OAB do Rio de Janeiro, a Seccional de Pernambuco  aprovou uma resolução que desobriga os advogados de todo o Estado a usarem paletó e gravata no seu cotidiano profissional. A resolução permite que o advogado escolha entre o uso do terno ou de camisa, calça e sapato social como traje em qualquer situação de exercício da profissão.

A entidade argumentou que a obrigação de usar a vestimenta é um transtorno para os pernambucanos, principalmente com o “aumento do calor nos últimos anos”.

De acordo com o Estatuto da Advocacia (lei Federal 8.906/94), cabe aos conselhos seccionais da OAB estabelecer, com exclusividade, critérios para o traje dos advogados no exercício profissional.

"Não estamos propondo abolir o uso do termo e da gravata. A resolução aprovada é no sentido de facultar ao advogado o uso de traje social, em razão do enorme desconforto que o nosso clima causa no uso diário do terno", afirmou o presidente da OAB-PE, Henrique Mariano.

Pela resolução, continua proibido o uso de roupas como bermudas, camiseta regata, jeans esportivo, tênis, chinelos, entre outros. "Os advogados que optarem por não usar ternos ou similares deverão se apresentar com vestimenta condizente com o decoro exigido para o exercício profissional" diz a resolução.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Habeas Corpus: A plenitude do direito de defesa


EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO

Paciente: MARCELINO RAMOS FILHO, JOÃO RAMOS E ADEMILTON RAMOS.
Autoridade Coatora: Juiz Titular da Vara Única da Comarca de Turiaçu - Maranhão (Luis Carlos Licar Pereira).
Advogado: Roberto Charles de Menezes Dias.
DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA AO HC N.º 0366372010

            ROBERTO CHARLES DE MENEZES DIAS, advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Seccional do Maranhão, sob o número 7823, com escritório profissional localizado na Av. dos Holandeses, quadra 11A, lote 14, Ed. Century Multiempresarial, sala 211, bairro São Marcos, Capital do Estado do Maranhão, onde recebe intimações, notificações e outras notícias de praxe e estilo forense, fundamentando-se no artigo 5°, incisos LXVIII (habeas corpus), e seus §§ 2° e 3° (tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos), da Constituição da República e nos artigos 647 e 649, I, do Código de Processo Penal, vem interpor 

ORDEM DE HABEAS CORPUS PREVENTIVO / LIBERATÓRIO, com pedido liminar,

em favor dos PACIENTES: MARCELINO RAMOS FILHO, JOÃO RAMOS E ADEMILTON RAMOS todos brasileiros, maranhenses, lavradores, residentes no povoado Capoeira Grande, pertencente ao município de Turiaçú - Maranhão, filhos de Marcelino Ramos e Maria da Conceição Ramos, que estão sendo vítimas de coação em sua liberdade de locomoção, por ato ilegal praticado pela autoridade coatora, o Juiz de Direito Titular da Vara Única da Comarca de Turiaçu-Maranhão.
            Para tanto alega as razões abaixo elencadas.

O CASO EM RESUMO

            Os PACIENTES foram levados a Júri Popular, pela suposta prática de homicídio, contra a vítima Antonio Martins Moreira.
            Entretanto, no dia da realização do julgamento - 08 de Fevereiro de 2011, a defesa chegando ao local marcado para a realização do julgamento e ao se dirigir para a sua mesa, que imaginou estar colocada no mesmo nível da mesa do Ministério Público, órgão acusador e, portanto, parte na Ação Penal, encontrou a seguinte situação:
·        As mesas que foram disponibilizadas para o promotor e para o juiz, eram mesas amplas, espaçosas, destinadas, via de regra, a professores em sala de aula.
·        No local destinado ao juiz e ao promotor, se disponibilizou tomadas onde se podiam ligar computadores, note-book e outros recursos tecnológicos, havia ventiladores, microfones, cadeiras confortáveis e acolchoadas e, como já dito, uma mesa ampla para cada um (juiz e promotor), conforme mostram as fotografias abaixo:


·        Conforme se pode também observar na foto acima, o juiz e o promotor estavam assentados a aproximadamente um metro e meio acima da defesa. Tendo sido colocada a mesa dos advogados de defesa literalmente aos pés do juiz e promotor.
·        Não suficiente essa situação vexatória e humilhante - estar sentados aos pés do juiz e promotor- note-se que a superioridade da estrutura disponibilizada para o juiz e para o promotor em relação à que foi disponibilizada para que a defesa pudesse desenvolver seus trabalhos era acintosa.
·        Não havia para os advogados: ventiladores, apesar do calor de quase 40o, o que tornava o ambiente insalubre; não foi disponibilizado microfones; apesar de requerido pela defesa e prometido pela autoridade coatora, não se disponibilizou tomadas elétricas para que fossem ligados os computadores dos advogados, as mesas cocadas a disposição da defesa era carteiras individuais de alunos, portanto baixas e pequenas; as cadeiras dos advogados eram desconfortáveis e em tudo diferentes da do promotor o do juiz e, por fim, a defesa foi posicionada de modo a não ter possibilidade de visão, nem tampouco acesso, ao que ocorria na mesa que presidia os trabalhos, a qual, diga-se de passagem, se confundia com aquela ocupada pelo patrono da acusação.
·        A superioridade física e estrutural na qual se encontrava o promotor em relação à defesa fica claramente demonstrada na foto abaixo, onde se pode perceber que da posição em que se encontra a autoridade coatora e o promotor, não se tem sequer a visão dos advogados e acusados, como se ambos - juiz e promotor - não quisessem ser incomodados com a visão dos defensores.
·        Por fim, para demonstrar de forma inconteste a discriminação, praticada pela autoridade coatora contra aos advogados e, sobretudo, aos acusados, o Colendo Conselho de Sentença foi colocado em posição tal, que não podia ver os acusados e somente podia ver os defensores parcialmente, conforme fotos que abaixo se anexa:


                Diante do que se apresentou acima, a defesa antes que se iniciassem os trabalhos requereu, informando haver espaço disponível para tanto, que defesa e ministério público fossem colocados no mesmo nível, nem se fazendo referência ao fato de que a mesa do promotor, que estava sozinho, era muito maior e mais confortável que a mesa da defesa, apesar desta - a defesa - ser composta por três advogados.
            A autoridade coatora, depois do requerimento da defesa, ouviu o ministério público, que afirmando ser prerrogativa do promotor sentar-se à direita do juiz, manifestou-se contrário ao pleito da defesa.
            Ressalte-se que em nenhum momento a defesa postulou sentar-se à direita, à esquerda, à frente ou atrás do juiz, postulou sim, com fulcro no princípio da paridade de armas, entre acusação e defesa, e no princípio da plenitude da defesa que não houvesse distinção ou privilégios ao ministério público em detrimento à defesa.
            A autoridade coatora, diante da manifestação do “MP”, indeferiu o pleito apresentando as seguintes razões abaixo transcritas:
Entende este juízo tal como dispõe a Constituição Federal que deve ser assegurada a plenitude de defesa, podendo os advogados usar tudo o que estiver ao seu alcance para garantir o direito de seu constituinte. Contudo, não se pode fechar os olhos ou chegarmos a hipocrisia de dizer que o Estado assegura plenamente todas as funções da determinação legal, podendo inclusive citar requerimento feitos pelo Juiz desta comarca para a construção de salão adequado para realização das Sessões do Tribunal do Júri, tanto que o juiz desta comarca vem se utilizando de prédios cedidos para realização de júri, não tendo envidado esforços para que haja aplicação da lei, não sendo demais recordar aos presentes que há 10 anos atrás quando assumimos a comarca, este município estava há 33 (trinta e três) anos sem realizar sessões do Tribunal Júri, portanto a população estava totalmente desprotegida da aplicação da lei. Por outro lado assiste razão ao Promotor de Justiça de tomar assento à direita do Juiz, previsão esta contida na Lei 8.625/93, por constituir-se prerrogativa do Ministério Público. A Ordem dos Advogados do Brasil também tem assegurado as suas prerrogativas que não podem ser ignoradas, sendo que não consta dentre estas que o advogado tome assento ao lado do juiz. Em particular entende Esso juízo pelo indeferimento do requerimento da defesa, pela não colocação da mesa dos advogados na parte mais alta deste estabelecimento, deixando transparecer que os acusados colocados em baixo estariam desprotegidos sem assistência do seu defensor ao seu lado, ou indo mais adiante deixar que subam os acusados e os policiam militares, seria apenas tornar um grande tumulto no lugar em que estamos, podendo até mesmo comprometer a segurança do magistrado ou daqueles que se encontram ao seu lado, não sendo demais para o momento relembrar incidentes que já ocorreram Brasil afora onde o magistrado teve a sua integridade física lesada. Entenda-se que os advogados podem se manifestar e fazer os requerimentos que entenderem convenientes e que a simples disposição de assentos não tirará o direito de defesa dos acusados, a exemplo de tantos júris que aconteceram nesta cidade. Assim sendo indefiro o requerimento apresentado pela defesa.
            Após o indeferimento da autoridade coatora, a defesa ainda pleiteou a reconsideração do juiz, elencando as razões de seu pleito, as quais foram registradas na ATA DE JULGAMENTO em anexo da forma como abaixo se transcreve:
MM Juiz considerando a negativa feita ao requerimento da defesa para que os assentos dos advogados fossem colocados ao mesmo nível do assento do Ministério Público a defesa, com todas as vênias, e manifestando profundo, profundo, profundo respeito e admiração pela justiça do Estado do Maranhão e em seu nome pela Justiça do Brasil, com todas as vênias, e com todo respeito já anteriormente citado e irresignadissímo com a decisão, deixa de promover a defesa nestas condições pelas razões que passa agora a elencar, protestando desde já que após as análise destas razões sejam as mesmas analisadas como um pedido de reconsideração ao magistrado sem a qual a defesa se retirará do plenário e impetrará um habeas corpus junto ao Tribunal de Justiça para que os acusados, no sentido de que tenham uma defesa com paridade de armas, e plenitude de defesa. Passo agora a elencar as razões da defesa o que certamente serão posteriormente complementadas pelos meus colegas de banca. PRIMEIRA RAZÃO. Em que pese quando criança ter sido educado pelo meu pai que quando se fala se deve demonstrar ao interlocutor as suas reações e perceber as deles, ou seja, olhar para o interlocutor, registro que a posição em que se encontra assentada a defesa, sentada de costas para a presidência dos trabalhos e para parte ex-adversa neste julgamento tendo que a todo momento aguardar o comando do magistrado para saber se pode ou não se manifestar, para compreender se o procedimento anterior se encerrou ou não, imprime ao exercício da defesa um grande prejuízo, pois é princípio e de conhecimento comezinho de todos, de que os procedimentos judiciais se faz pelo princípio da oportunidade, ou seja, respeito aos prazos e aos momentos. Portanto, dispiciendo afirmar que sem saber a defesa o que está acontecendo na mesa que preside os trabalhos esta tem, imagino, humildemente da minha posição de advogado iniciante no direito que esta situação é uma situação de clareza meridional de cerceamento de defesa. SEGUNDA RAZÃO Apenas depois de iniciada a manifestação deste trabalho e depois de iniciado este requerimento foi que lembrou-se que a defesa precisava de microfone para se manifestar, o que mais uma vez se caracteriza a forma discriminatória com a qual a defesa está sendo tratada neste julgamento. Entende este advogado que os recursos tecnológicos hoje fartamente colocados à disposição da população brasileira e com certeza à disposição dos advogados que agora aqui se apresentam, como por exemplo uma mera tomada para que o advogados ligasse o seu notebook e fazer minimamente uma defesa eficiente. No entanto, registre-se que a defesa já não dispunha de microfone e até o momento continua não dispor de recursos tecnológicos minimamente oferecidos à população desta cidade e que certamente poderiam ser oferecidos a esta banca de advogados, assim seria irresponsabilidade e falta de compromisso com a profissão da defesa se submeter a estas condições, trazendo um visível prejuízo a defesa e aos direitos dos defendentes. Registre-se por oportuno que para maior entendimento daqueles que no futuro irão considerar estas razões que a defesa não pleiteia por recursos tecnológicos de altíssima sofisticação, pleiteava neste momento apenas o mínimo necessário para o exercício do seu mister. TERCEIRA RAZÃO. O desnível no qual se encontram colocados os advogados e aqueles a quem defendem de quase dois metros de diferença e aos pés do juiz e do promotor em um ambiente onde tradicionalmente se realizam manifestações artísticas, shows e palestras, ou seja, onde todos se acostumaram a compreender que quem está em cima se manifesta e que quem está embaixo assiste, já traz no seu bojo indubitável sentimento de inferioridade, inferioridade inclusive manifestadas nas razões elencadas por este juízo, com a máxima vênia, aqui peço permissão para citar as razões manifestadas por este juízo para inverter o pleito, que traz em seu bojo, ainda que involuntário, certa conotação de preconceito e discriminação ao afirmar que mandar subir os acusados poderia representar para o juízo e para o promotor, para o juiz e para o promotor, repito, "insegurança". Não fossem estas as razões já elecandas suficientes para o protesto da defesa e a recusa neste momento de continuar realizando o ato, restam ainda algumas outras, que de forma sucinta, enumero para depois comentá-Ias: Primeira delas "não têm os advogados direito de tomarem assento ao lado do juiz, os acusados não podem subir e também não podem ficar lá embaixo sozinhos porque poderiam imaginar que estes estivessem desprotegidos. mais uma vez, a defesa meritíssimo juiz não julga se é prestigio sentar-se ao lado do magistrado, no entanto, não admite tratamento discriminatório com seu defendente ou consigo mesmo e por fim, apenas para que se reproduza com fidelidade o pleito feito por este advogado quando ele ainda não dispunha de microfone foi não de subir, mas o de que defesa e acusação estivessem respeitados conforme o principio inserto art 38, V da Constituição Federal, a plenitude no exercício de suas atividades o que neste caso creio resta provado a patente diferença do tratamento, por fim mais uma vez manifestando profundo, profundo respeito e admiração ao magistrado Dr. Licar e ao Promotor Dr. Hagamenom, deixo claro para os senhores que não podem me ver, para alguns dos jurados que me vêem em parte e para o plenário que me olha com atenção, registro do profundo do meu coração que essa situação de falar para quem está as minhas costas tendo como já dito, que aguardar o comando do magistrado e da própria escrivã para saber quando posso continuar ou não, porque não consigo vê-los, tendo inclusive que contar com o auxilio gentil de alguns assistentes que vendo o julgamento sinalizam quando eu posso continuar e quando posso parar. Registro que apesar da imensa vontade de fazer esse júri e de patrocinar a defesa dos acusados a defesa de minha parte com todas as vênias protesta veementemente, se retira do plenário e requer seja marcada uma nova data com condições de, respeitadas a plenitude da defesa, não dos advogados, repito, que não postulam em causa própria e aos direitos dos cidadãos submetidos a julgamento, estes são os exatos termos conforme já citado alhures, pede reconsideração ou se entender de modo diferente o magistrado, o que se admite apenas por amor ao debate que seja marcada uma outra data para julgamento. MANIFESTAÇÃO DO ADVOGADO ERIVELTON LAGO. Comunidade de Turiaçu, senhores jurados e senhoras juradas Excelentíssimo Juiz Presidente deste Tribunal, Excelentíssimo Promotor de Justiça, não estou de costas em sinal de protesto, estou de costas por uma obrigação imposta pela posição em que nós advogados fomos colocados, mesmo assim peço desculpas. Réu é coisa sagrada, deve ser defendido plenamente pelos seus advogados na mesma posição do seu acusador. Os advogados lutam pela plenitude dos homens, pela plenitude da defesa dos homens e pela igualdade de armas e oportunidades. Os defendentes são réus, mas são humanos iguais perante a lei de Deus, perante a Lei dos homens e de Deus, ninguém mesmo no fundo do poço, mesmo preso, mesmo sem o direito de ir e vir deve ser tratado com discriminação isso é o que diz as constituições de todos os países democráticos, de todos os países democráticos, finalmente deixo descrito na minha manifestação a certeza da admiração que tenho pelo juiz dessa comarca Dr. Licar, embora a sua decisão tenha sido contrária ao nosso pleito. Mesmo assim reitero o que disse o meu antecessor apenas para que fique clara a nossa vontade e intenção de fazer a defesa dos réus hoje, pede reconsideração. MANIFESTAÇÃO DO ADVOGADO DR. JOÃO JOSÉ DA SILVA. Excelentíssimo Sr. Dr. Licar Juiz Presidente deste Egrégio Tribunal do Júri, Dr. Hagamenon Promotor de Justiça, senhores e senhoras do Conselho de Sentença, sociedade de turiaçu que tantas vezes já me viu presente em sessões do Tribunal do Júri aqui nesta comarca. Ontem por volta das zero hora, me encontrava em minha residência quando fui procurado pelo comandante da Polícia Militar e da Delegada Regional de Pinheiro a Dra. Laura Amélia para que me fizesse presente para tentar contribuir de uma forma ou de outra com uma rebelião que está acontecendo na Delegacia Regional de Pinheiro. Quando lá cheguei me deparei com a situação de 97 presos, um quadro lamentável estarrecedor quando naquele momento já haviam decepado a cabeça de dois presidiários e mais três corpos estendidos. E eu ao sair de lá 6:00 h da manhã, viajei para a comarca de Turiaçu para realização deste júri, fato que demonstra o desejo de aqui praticar o meu mister. Porque estou narrando isto?! Porque é inadmissível por inoperância, por escolha, por descaso do Estado colocar a vida e a integridade dos homens nas condições que estão sendo colocadas a vida dos presos da Delegacia Regional e hoje em risco em desempenho em relação aos acusados hoje submetidos a esta sessão do Tribunal. Digo isto porque no que pese já ter realizado vários trabalhos na condição que aqui estou hoje, mas não podemos aceitar como argumento que por inoperância do Estado, repetindo, deixe de ser aplicado na sua plenitude, o princípio constitucional da ampla defesa. No dia 15.11.2010 eu me fazia presente para sessão de julgamento dos mesmos acusados, Marcelino, João e Ademilton, naquela oportunidade V. Excelência a requerimento do Ministério Público e sob a alegação de que tinha sido procurado de forma "sigilosa" por alguns jurados de que se sentiam ameaçados pelos acusados e sem qualquer, datíssima vênia, prova e/ou investigação lhe foram decretada a prisão preventiva, diga-se de passagem Excelência, que os acusados permaneceram em liberdade durante toda a instrução processual e que este fato ocorreu em 1999, portanto aproximadamente 12 anos e durante todo esse ínterim não há registro de que os acusados tenham se comportado em relação a este fato de forma que pudesse prejudicar a realização dos atos processuais, inclusive o Júri Popular. Diante disso, entendo que inexistem elementos que possam caracterizar ou que possam sustentar neste ato aquela decisão, pois neste momento não se trata de nenhuma causa provocada pela defesa haja visto que, o que aqui se discute exatamente é a garantia de princípios constitucionais. Assim sendo corroborando com todos os argumentos levantados pelos colegas que me antecederam pugno pela reconsideração da decisão sobre o qual nos manifestamos, para que se possa dar prosseguimento à sessão do Tribunal do Júri e o definitivo deslinde deste processo. Todavia não sendo esse o entendimento de V. Excelência, o que não é o crível, requer-se a revogação das prisões preventivas dos acusados, bem como a designação de nova data para realização da Sessão do Tribunal do Júri com a posição da defesa nos termos do requerimento inicial. Por fim entende-se ser imperiosa a revogação da prisão posto que não resta demonstrado nenhum dos elementos que possam caracterizar a sua manutenção e ainda ser de conhecimento de toda a sociedade de que os acusados são primários, de bons antecedentes, com residência fixa, trabalhadores e que em nenhum momento deixaram de comparecer aos termos demandados deste douto juízo é o que se requer. (sic)
            O magistrado coator, após a manifestação da defesa ouviu outra vez o MP e, decidiu manter a decisão anteriormente tomada - indeferir o pleito -, bem como manter a prisão preventiva dos acusados.
            Assim, os advogados se retiraram do plenário, por não aceitar se submeter à situação tão desrespeitosa e discriminatória.
            Impende, no entanto, ressaltar, que o crime que se pretendia julgar naquela data, ocorreu no ano de 1999, portanto, há 12 (dose) anos atrás, e que já se tentou, em data pretérita, realizar o julgamento dos acusados, contudo, naquela tentativa anterior, foi pedido, pelo Ministério Público o adiamento do julgamento e a prisão preventiva dos acusados, conforme trecho da ata de julgamento abaixo transcrito:
Pelo representante do Ministério Público foi pedido o adiamento do julgamento e a prisão preventiva dos acusados, tendo em vista que o Ministério Público informado sigilosamente que vários jurados foram procurados pelos acusados e seus familiares, coagindo os jurados de modo a interferir favoravelmente no julgamento e para que não haja comprometimento da imparcialidade do julgamento, requereu deferimento do seu pedido.
            A defesa na oportunidade - na mesma seção de julgamento - questionou o caráter sigiloso da informação trazida pelo promotor, conforma consta em ata, às folhas 133 da ação penal em anexo, contudo, o pedido de adiamento do julgamento e prisão preventiva dos PACIENTES foi deferido pela autoridade coatora, sem, contudo, averiguar se o fato efetivamente ocorrera, em claro desrespeito ao contraditório e ampla defesa, visto que não é permitido se fazer alegações sem provas, pois é comezinho o princípio de direito de que “o ônus da prova incube a quem alega”.
            Os PACIENTES, que são pessoas pacatas na cidade, que não possuem antecedentes criminais, sendo, portanto primários, que possuem residência fixa, possuem atividade laboral lícita, e estão sendo processados por um crime que aconteceu a mais de 12 anos, acham-se hoje, recolhidos ao xadrez, em virtude de uma afirmação, pasmem, sigilosa, onde não se tem prova de onde saiu, quem foi o jurado coagido ou o que é mais grave, se a coação efetivamente existiu.
            Estes, Senhores Desembargadores, são os fatos que impende relatar e bastante em demonstrar a coação ilegal que vem sofrendo os PACIENTES.

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS

            A Constituição Federal da República, dentro do capítulo no qual elenca os direitos fundamentais do ser humano, e que, portanto, são consideradas cláusulas pétreas da nossa carta máxima, assevera em seu artigo 5º, XLVIII[1], que se concederá Habeas Corpus, sempre que alguém sofrer ou se encontrar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
            Reparem que no dispositivo legal o termo usado foi “sempre”, e reparem mais ainda que, no que se refere a violência ou coação por abuso de poder ou ilegalidade, não se faz nenhuma exceção, portanto, não importa se ela é atual, iminente ou remota.
            Assim, quis o legislador constitucional permitir o uso do remédio hercúleo para sanar todas as situações - atuais, iminentes ou remotas - que envolvessem coação ou ameaça de coação por ilegalidade ou abuso de poder, ao direito de locomoção, ou seja à liberdade, que nesse caso deve ser considerada no seu sentido lato, não importando se a coação ilegal restringe parcela de liberdade ou toda a liberdade, por isso mesmo o legislador usou a locução “sempre”.
            Desse modo, além da liberdade propriamente dita que se discute neste writ, qualquer ilegalidade que ocorra no julgamento e que possa importar em cerceamento ou prejuízo a defesa, o que representa ameaça ao direito de locomoção, provocada por coação ilegal, é atacável por via do Habeas Corpus, conforme entendimento pacífico nos pretórios superiores.

DA SITUAÇÃO DOS PACIENTES

            Antes de adentrar na discussão de mérito da desnecessidade da prisão dos PACIENTES, impende afirmar, como já dito, que os pacientes são irmãos, agricultores, residentes no povoado Capoeira Grande, município de Turiaçu, desde que nasceram, são réus primários, participaram do crime ora em comento há 12 anos atrás, sem nunca terem se envolvido em nenhum problema antes ou depois deste fato, possuem família - esposa e filhos - possuem atividade laboral lícita e apesar de humildes, possuem ótimo relacionamento na cidade onde residem.

DO DIREITO

            O princípio da inocência foi estabelecido na Constituição Federal como presunção em favor do acusado. É pacífico, portanto, que a prisão cautelar, gênero do qual a prisão preventiva é espécie, deve ser utilizada de modo criterioso, sob pena de restar ferido o periculum libertatis do acusado.
            Veja-se que conforme renomados criminalistas, a decretação da pena de prisão em uma sentença condenatória deve merecer criteriosa análise, assim muito mais cuidado há que se ter com a prisão cautelar (prisão preventiva), que se configura exceção à regra, mas que, na atual conjuntura, tem sido regra geral, muito embora se trate de medida que restringe a liberdade do indivíduo e pode deixar seqüelas irreparáveis.
            A utilização da prisão preventiva como regra segue na contramão da norma inscrita no inciso LVII do art. 5º da nossa Carta Republicana, verbis:
Art. 5º .(...)
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
            O ilustre Professor Fernando da Costa Tourinho Filho é um crítico veemente da prisão cautelar, por entendê-la "supinamente inconstitucional" e odiosa. Ao comentar a Lei nº 7.960/89, que trata da Lei da Prisão Temporária, mas que tem os mesmos requisitos de qualquer prisão cautelar, dispara o nobre jurisconsulto[2]:
Ademais, a medida é tão estúpida que, se realmente não houver necessidade para sua decretação, nem haverá tempo para julgá-la mercê de um habeas corpus: primeiro, porque em face da exigibilidade de tempo e, em segundo lugar, porque em sede de habeas corpus, normalmente, não se faz um exame analítico de provas...
            No entanto, o que se vê nas decisões judiciais é a falta de percepção, de nossos magistrados, do absurdo de se utilizar indiscriminadamente a prisão preventiva, que fora criada com um propósito, mas que vem sendo usada de forma distorcida, revelando-se uma praxe processual.
            Assim, o que se discute, no tocante à prisão preventiva, é a liberdade do indivíduo, bem maior assegurado pela Constituição Federal, e que, por se tratar de direito elevado à cláusula pétrea, não pode sofrer restrições ilegais. Ou seja, a decretação da prisão ante tempore deve ser necessariamente cercada de todos os cuidados.
            A prisão preventiva tem se constituído em um importante instrumento em mãos dos magistrados que, usando e abusando de um discurso legalista-positivista, justificam a aplicação desse instituto em nome de uma indefinida segurança que se resume na expressão genérica de "ordem pública".
            O legislador, ao impor como fundamento da sua decisão o critério genérico do "perigo à ordem pública" (assim como à "ordem econômica", ou à "ordem processual"), como argumento legitimador para a decretação da prisão preventiva criou uma situação que remonta àquela relação surrealista retratada por Franz Kafka, em seu livro "O Processo", em que na relação do sujeito com o Estado esse se justifica mesmo que sem controlar todos os efeitos de sua vontade; vontade essa que só existe através daqueles que existem nele, prontos ao exercício de sua autoridade, ainda que não venham a participar do processo de elaboração dessa mesma vontade, mas robotizados, cumprem as suas tarefas sem muita reflexão, agarrando-se numa generalidade objetificante. Já o sujeito, enquanto isso, apenas sofre os efeitos desse poder, submetendo-se sem nem mesmo compreender o porquê de sua suposta responsabilidade.
            E isso é assim na prática do dia-a-dia, em que é um desafio justificar para o sujeito e para o todo social (família, grupo social, comunidade) que o envolve, as razões de determinada pessoa estar recolhida ao espaço da prisão sem que se tenha efetivamente provado a sua culpa ou responsabilidade por um suposto ilícito ao qual ele ainda não foi definitivamente condenado.
            Como o personagem "K", personagem símbolo de Franz Kafka, muitos sujeitos não conseguem compreender as razões e a motivação que os conduz primeiro a uma sanção e depois ao processo, numa manifesta e indisfarçável inversão do devido processo legal, bem como numa explícita violação da presunção da inocência antes da culpa, o que leva tal decisão de forma objetiva e sistemática, a ferir princípios, tais como os do contraditório e da ampla defesa, pois os julgadores se mantêm atrelados em um discurso que transforma o sujeito que recebe a sanção cautelar em um algo diferente do próprio mundo, coisificados pela "percepção soberana desse julgador", que vê assim, uma necessidade metafísica em sua segregação.
            Inevitável que se reconheça que ao segregar um indivíduo do restante do corpo social, a prisão preventiva marca tal sujeito com valores nefastos, praticamente definitivos, pois que os efeitos dessa segregação têm o condão de consolidar um quê de culpa que não raro, e que nem mesmo com a posterior comprovação da inocência se consegue apagar.
            Como no livro de Kafka, o discurso jurídico em nosso país é fechado em si mesmo, envolto em mistérios que se apresentam como ritos exclusivos de alguns poucos "escolhidos", que afastam todos aqueles que buscam interpretá-lo para, então, compreendê-lo, infelizmente, sem conseguir.
            E é essa distância que cria uma sensação de claustrofobia, já que o direito parece alcançar a capacidade de se manifestar numa ausência que é entendida como um descolamento do mundo e do tempo, ainda que tenha a pretensão de se fazer valer sobre esse mesmo espaço mundano-temporal. Aos operadores, encerrados em si mesmos e que se impõem a difícil missão de desvelá-lo, fica o desafio de dar um sentido e um significado que possam ser compreensíveis aos demais, isto é, aqueles outros que estão "fora" desse universo particular em que a lei é supostamente justificada.
            E ao arcarem com a imposição dessa responsabilidade, tais operadores da lei acabam por se anestesiar quanto a real importância de seu papel, e anestesiados pela soberba da decisão, não percebem que contribuem para a construção de amplos espaços entre a lei e o ser mundano-temporal.
            Reduzido a um discurso que não tem interesse no contexto, isto é, desinteressado da realidade concreta e do sujeito que sofre com os efeitos de sua enunciação, tal discurso é apenas mera argumentação jurídica lançada pelo sujeito soberano como palavra fundante de uma verdade que acredita ser desmistificada por ele.
            A decisão do juiz acaba sendo, assim, mais uma forma de violência, violência simbólica, e que oblitera qualquer capacidade de comunicação com o restante da sociedade, e até com o próprio sujeito que sofre com a decretação dessas suas decisões, no caso, da prisão preventiva.

DA AUSÊNCIA DE AMEAÇA À ORDEM PÚBLICA

            Impende aqui levantar-se algumas considerações sobre o tema “garantia da ordem pública”, para demonstrar que no caso em tela, a liberdade dos PACIENTES não representa ameaça a ordem pública, e mais, para demonstrar que o argumento de garantia da ordem pública não é idôneo, para manter no xadrez os PACIENTES.
            A "garantia da ordem pública" chamada a socorrer diversas interpretações a ela dada, com os mais diversos fins, havendo principalmente na jurisprudência, enorme casuísmo no trato da matéria, conduzindo a interpretações as mais variadas, gera uma insuportável insegurança jurídica no trato de tema tão importante, qual seja, a privação da liberdade antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
            Do resgate das expressões utilizadas para dar significado à "garantia da ordem pública", constata-se que as mesmas são em verdade fórmulas vazias e sem conteúdo processual, como por exemplo, a ‘potencialidade lesiva do crime’ ou ‘gravidade do delito’, a ‘preservação da credibilidade na Justiça’, a ‘periculosidade do agente’ ou ‘reiteração criminosa’, o ‘clamor público’, entre outras presentes na jurisprudência.
            A ‘potencialidade lesiva’ ou ‘gravidade do delito’, não poderá servir de base para a manutenção da prisão de alguém, afinal, isto por si só não enseja a custódia do agente, uma vez que não mais existe prisão preventiva obrigatória para crimes graves na legislação brasileira, devendo-se demonstrar no caso concreto, quais elementos indicam o periculum libertatis.
Veja-se a orientação do Supremo Tribunal Federal:
"A gravidade do crime imputado ao réu, por si só, não é motivo suficiente para a prisão preventiva". STF, HC. nº 67.850-5.
            Neste mesmo sentido o HC 65.950, HC 76.730 e HC 79.204, dentre outros, todos do STF.
            O argumento de que a necessidade de ‘preservação da credibilidade na justiça’ pode acarretar a prisão para "garantia da ordem pública", é dos que mais atenta contra os princípios processuais penais cautelares, pois, "a prisão preventiva não pode ser instrumento da ação judicial para servir a essa pobreza cultural que exige cadeia imediatamente para todo e qualquer acusado..." [3]. A via da ‘exemplaridade’ e da ‘satisfação do sentimento de justiça’, não são fundamentações coerentes para a prisão preventiva, pois, tratam-se de aplicação de uma justiça sumária, que viola o devido processo legal e a presunção de não-culpabilidade.
            O argumento relativo à ‘periculosidade do agente’, que visa fundamentar a prisão preventiva para que o agente não ‘volte a delinqüir’, não ‘prossiga na reiteração criminosa’ ou não ‘consume um crime tentado’, acarreta verdadeira presunção de culpabilidade.
            Sem dúvida, não há como negar que a decretação de prisão preventiva com o fundamento de que o acusado poderá cometer novos delitos baseia-se, sobretudo, em dupla presunção: a primeira, de que o imputado realmente cometeu um delito; a segunda, de que, em liberdade e sujeito aos mesmos estímulos, praticará outro crime ou, ainda, envidará esforços para consumar o delito tentado. Com a referida presunção de reiteração, restariam violadas, portanto, as garantias constitucionais da desconsideração prévia de culpabilidade (Constituição da República, art. 5º, LVII) e da presunção de inocência (Constituição da República, art. 5º, § 2º, c/c os arts. 14, 2, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, e 8º, 2, 1ª parte, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos).
            A prisão preventiva, assim, perde seu caráter cautelar de tutela da efetividade do processo transformando-se em meio de prevenção especial e geral, fins exclusivos da sanção penal, configurando verdadeira punição antecipada.
            Nesse sentido é a opinião de Almeida (2003)[4] e Lopes Júnior (2005)[5] ao considerar que manter "uma pessoa presa em nome da ordem pública, diante da reiteração de delitos e o risco de novas práticas, está se atendendo não ao processo penal, mas sim a uma função de polícia do Estado, completamente alheia ao objeto e fundamento do processo penal" (LOPES JÚNIOR, 2005, p. 203).
            Também é amplamente contestado talvez seja esta a fórmula mais criticada, ventilar que o ‘clamor público’ pode fundamentar a prisão preventiva. Isto, pois, ‘ordem pública’ e ‘clamor público’ são coisas distintas e este não implica necessariamente naquele. Ademais, na maioria dos casos concretos, não se vislumbra qualquer alteração excepcional no bojo social, que não seja a decorrente de qualquer delito que se cometa.
            Conforme Lopes Junior é inconstitucional atribuir à prisão cautelar a função de controlar o alarma social, e por mais respeitáveis que sejam os sentimentos de vingança, nem a prisão preventiva pode servir como pena antecipada e fins de prevenção, nem o Estado, enquanto reserva ética, pode assumir papel vingativo. (LOPES JUNIOR, 2005, p. 206)
            Assim a "garantia da ordem pública" não possui caráter cautelar propriamente dito, tendo na verdade finalidades que ora são meta processuais, ora são exclusivas das penas; as interpretações dadas à expressão "garantia da ordem pública" são violadoras do princípio da presunção de inocência, pois, ou desconsideram a avaliação da necessidade da medida, ou se fundam em presunções e antecipações do juízo de culpabilidade.
            De modo que não sendo a "garantia da ordem pública" uma Razão de Cautela propriamente dita, a mesma não deve ser suficiente à decretação da prisão preventiva, só podendo ser decretada a prisão em um caso concreto, quando existir um fundamento de natureza realmente cautelar, que demonstre risco à efetividade do processo.

DA AUSÊNCIA DE AMEAÇA A INSTRUÇÃO CRIMINAL

            Senhores Desembargadores, como já dito, o crime ocorreu Há 12 anos atrás, e durante todo esse período, os pacientes estiveram soltos, trabalhando, cuidando de suas famílias, sem nunca, repita-se, nunca, terem se envolvido em qualquer problema na localidade onde vivem, ou fora dela, nunca ameaçaram ninguém, enfim, sempre ; levaram uma vida de cidadãos pacatos da cidade.
            Por outro lado, quaisquer situações atinentes ao processo penal, que se quisesse preservar com a prisão dos PACIENTES, se desnaturaram com o passar dos 12 longos anos existentes entre a ocorrência do fato e a data presente. 
            Por fim, a alegação de que o promotor teria recebido a informação “sigilosa” de que os jurados teriam sido procurados para absolverem os PACIENTES, seria risível, se não fosse trágico, notem, Senhores Desembargadores, que três homens foram presos, porque o promotor, sem nenhuma prova, informou que fora sigilosamente informado de que os PACIENTES procuraram os jurados, pergunta-se, onde, no Direito Penal, se admite acusação sem prova? Quem já ouviu dizer, excetuando-se esse absurdo que ora se discute, que um magistrado possa determinar a prisão de alguém por uma situação semelhante a essa?
            O decreto prisional que hoje pende contra o PACIENTE, e aqui guerreado, apoiou-se em elementos insuficientes, destituídos de base empírica idônea, revelando-se, por isso mesmo, desprovido de necessária fundamentação substancial.
            O STF, de forma remansosa, já firmou o entendimento de que a privação cautelar é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade por isso tem censurado prisões privativas que se baseiam apenas no reconhecimento dos elementos próprios do tipo penal - a gravidade “em abstrato” do crime - também não basta para justificar a privação cautelar, a alegação de que o acusado deve ser preso “para resguardar a credibilidade do próprio Judiciário e das demais instituições responsáveis pela segurança pública”.
            As razões trazidas pelo Magistrado Coator para decretar a prisão do PACIENTE são fundadas em juízo meramente conjectural e sem qualquer referência a situações concretas, as alegações trazidas na ordem de prisão, sem uma base empírica são presunções arbitrárias que não podem legitimar a privação cautelar da liberdade individual.
            A propósito da decretação de prisão ilegal, o ilustre professor Hélio Tornaghi[6] elucida brilhantemente:
O juiz deve ser prudente e mesmo avaro na decretação. Há alguns perigos contra os quais deveriam presumir-se todos os juízes, ao menos os de bem: o perigo do calo profissional, que insensibiliza. De tanto mandar prender, há juízes que terminam esquecendo os inconvenientes da prisão. Fazem aquilo como ato de rotina... o perigo da precipitação, do açodamento, que impede o exame maduro das circunstâncias e conduz a erros.”
            E adverte o ilustre professor:
O perigo do exagero conduz o juiz a ver fantasmas, a temer danos imaginários, a transformar suspeitas vagas em indícios veementes, a supor que é zelo o que, na verdade, é exacerbação do escrúpulo.
            E continua:
"O juiz prepotente é uma calamidade, é um criminoso que tem em uma das mãos a poderosa arma da prisão provisória e na outra um bill de indenidade. Para ele não há freios internos nem disposições de espírito; só a lei pode coartá-lo e contê-lo dentro dos limites da razão ou mandá-lo para o manicômio[7]"
            Mister salientar que o princípio da inocência, consagrado na Constituição Federal como cláusula pétrea, foi estabelecido pelos nobres jurisconsultos como presunção em favor do acusado.
            É pacífico, portanto, que deve a prisão cautelar se constituir exceção e, por assim, deve ser utilizada de modo criterioso, sob pena de restar ferido o periculum libertatis do acusado.

DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL

            Restaria, Senhores Desembargadores, por fim, a possibilidade de que alguém pudesse argüir a suposição de que em liberdade, os PACIENTES poderiam querer se furtar a aplicação da Lei Penal.
            Contudo, nada que consta dos autos, cuja cópia de inteiro teor se anexa, autoriza a presunção de que os PACIENTES, uma vez livre, possam se evadir do distrito da culpa.
            Os PACIENTES são Tecnicamente primários, têm bons antecedentes, residência fixada no distrito da culpa, atividade laboral lícita, possuem um pequeno centro de negócios, têm esposa, filhos, enfim, tudo a indicar que eles estão tão firmemente “enraizados” na localidade que se apresenta como muito improvável a possibilidade de que possam abandonar a família, os negócios e a segurança de seus lares, para se lançarem em uma vida errante de foragido da justiça, a mais das vezes infrutífera.

DA ILEGALIDADE PRATICADA DURANTE O JULGAMENTO

            Pois bem, no que se refere ao tratamento dispensado aos advogados, já alhures referido e demonstrado por meio de fotografias, tal fato traz à tona o imenso abismo existente entre advogados, membros do Ministério Público e do Judiciário. Não obstante nosso ordenamento jurídico prever que advogados, juízes e promotores estão no mesmo patamar de igualdade, não havendo qualquer tipo de hierarquia entre eles, o fato é que, na bem da verdade, muitos juízes e promotores acreditam, sinceramente, que são mais importantes ou essenciais à Justiça do que os profissionais do Direito, que, na maioria das vezes, sofrem tratamento desigual por parte destes.
            Prova inconteste é a decisão do magistrado coator que, contrariando princípios basilares do direito, legitimou aos membros do Ministério Público o direito de acharem que estão acima dos Advogados e, portanto, continuarem a agir como tal. Ora, o simples fato de no julgamento pelo Tribunal do Júri estar Juiz e Promotor um “degrau” acima dos Advogados, como que se dissessem “vocês aí em baixo, olhem pra cima ao se dirigirem a nós, Autoridades” já mostra o total desequilíbrio com que são tratados os Advogados na relação judicial.

            E mais, permitir ao Ministério Público - que é tão mandatário de poderes quanto os Advogados - de participar do Julgamento em local mais elevado em relação as demais partes do processo, conduzindo do alto de seu trono as perguntas e questionamentos que lhes aprouver, é tornar a Defesa do Réu menos importante que a Acusação, que fará as suas perguntas, só que agora “ao nível do mar“.
            Salienta-se que ao menos avisado pode parecer ser um capricho ou uma exigência barata dos Advogados de que Promotores permaneçam sentados em mesmo plano nos julgamentos no Tribunal do Júri. Contudo, inúmeros estudos já revelaram que pessoas sentem-se mais intimidadas quando interrogadas por alguém que se encontra em uma situação de superioridade, como a de estar sentado um degrau acima, evidenciando a mensagem de poder e submissão ao interlocutor.
            A população mais humilde e de pouca instrução é, na maioria das vezes, a mais influenciável por esta situação. Com isso, ao serem indagadas por Promotores e Advogados, as testemunhas mostram-se mais suscetível aqueles, diante da imagem de poder que a diferenciação lhes transparece. Logo, várias sentenças são prolatadas sem que as provas tenham sido produzidas em pé de igualdade, gerando manifesto prejuízo à justiça.
            Assim, estar Promotor e Advogado sentados em mesmo plano não se trata de um privilégio ou favor concedido ao patrono do Réu, mas sim de observância ao estrito cumprimento da lei, que é extreme de dúvidas. Vide o Estatuto da Advocacia, em seu artigo 6º: “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”.
            Portanto, acusação e defesa devem se encontrar em igualdade, por que é assim que podemos compreender a democratização da justiça, em especial a penal, sempre havendo a efetiva garantia de direitos fundamentais e processuais. A visão deve ser holística, e não ínfima e redutível, já que, sem defesa, a acusação perde o sentido de ser.
            Quanto ao julgador, foi-se o tempo em que o Juiz era o bouche de la loi, o boca da lei, em que eram tácitos os decisionismos e as arbitrariedades, máxime no Tribunal do Júri, onde quem julga é a população. O entendimento atual mais coerente é mesmo o da igualdade na formação triplanar do processo: juiz, acusação e réu.
            Assim a controvérsia a ser resolvida através deste mandamus é saber se obedece aos princípios fundamentais do processo penal democrático o tratamento absolutamente díspar dispensando ao Ministério Público, conforme já demonstrado, para o promotor toda a estrutura e conforto para realizar seu trabalho, para a defesa, nem o mínimo necessário, como por exemplo uma tomada.
            A simples leitura dos fatos processuais revela a clara ofensa ao princípio da paridade de armas.
            Além disso, conforme estabelece o art. 125, inciso I, do Código de Processo Civil, aqui aplicado de forma subsidiária, a igualdade de tratamento das partes é um dever do juiz e não uma faculdade, sendo certo que as partes e os seus procuradores devem merecer tratamento igual, com ampla possibilidade e oportunidade de fazer valer em juízo as suas alegações.
            A necessidade de se assegurar aos litigantes um tratamento equânime, para que os sujeitos processuais desempenhem seu mister em condições parelhas, é a essência da estrutura dialética que norteia o caráter instrumental da Lei Processual Penal.
            Neste sentido, escólio dos ilustres magistrados Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho e Sólon Bittencourt Depaoli, que em recente artigo publicado no Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM abordam o tema do seguinte modo:
“...A conformação estrutural dessa idéia resulta nas hipóteses de participação efetiva das partes, em caráter de equilíbrio, exercitando “simétrica paridade das suas posições, na mútua implicação das suas atividades (destinada, respectivamente, a promover e impedir a emanação do provimento); na relevância das mesmas para o autor do provimento.”
            Como já dito é certo que os impetrantes não desconhecem que o writ em comento só deve ser empregado quando estiver em jogo a locomoção do paciente. Todavia, não é necessário que a ameaça ou lesão à liberdade do paciente esteja sendo diretamente violada. Como bem destacado no aresto proferido pelo Tribunal Pleno da Suprema Corte no julgamento da AI-QO 664567 / RS, “Para obviar a ameaça ou lesão à liberdade de locomoção - por remotas que sejam - há sempre a garantia constitucional do habeas corpus”.
            Por fim, a disparidade de tratamento concedido as partes é um fato incontroverso.
            Neste sentido, a questão central versada no presente writ e que enseja não só a provocação dessa Corte, como a necessidade da concessão de medida liminar, para que se evite a realização de atos processuais que posteriormente poderão ser declarados nulos, está na admissão ou não da possibilidade das partes litigantes em ação penal obterem tratamento tão díspar.

Da liminar

            Como se vê, a fumaça do bom direito reside na flagrante violação dos princípios da paridade de armas e da razoabilidade, ambos a garantir que o tratamento concedido à defesa seja igual aquele oportunizado ao representante do Parquet.
            O perigo na demora da prestação jurisdicional repousa no fato de que a decisão denegatória da ordem proferida pela autoridade coatora impõe para o próximo mês, a realização do julgamento dos PACIENTES, onde, poderá a autoridade coatora, insistir em realizar o feito, repetindo todo o desrespeito aqui demonstrado com o inteiro teor dos autos e fotografias tiradas durante a sessão do julgamento e da qual se retiraram os advogados.
            Ante o exposto, requerem os PACIENTES liminarmente seja determinado à autoridade coatora que dispense à defesa e ao MP tratamento igualitário durante o julgamento ou alternativamente, que seja suspenso o julgamento pelo Tribunal do Júri, até o julgamento de mérito desse writ.

DO PEDIDO

            Como se pôde perceber ao longo desta impetração é patente a agressão ao princípio da igualdade das partes, cuja perenização colocará em risco um dos pilares que sustentam o processo penal democrático.
            Assim, diante do todo acima alegado, diante das provas e documentos que se junta a este Habeas Corpus, bem como diante de tudo o mais que dos autos consta e, ainda, contando com os lúcidos suplementos jurídicos de Vossas Excelências requer-se:
·        Seja liminarmente concedida a ordem de Habeas Corpus, para que se faça cessar a coação ilegal sofrida pelos PACIENTES. E, com vistas a subsidiar a decisão de Vossas Excelências e evitar o pedido de informações ao Magistrado Coator, se junta as cópias do inteiro teor dos autos da Ação penal que corre em desfavor dos PACIENTES;
·        Seja, depois de deferida a liminar pleiteada, expedido, por via de conseqüência, determinação ao magistrado coator para que dispense tratamento igualitário à defesa e à acusação durante o julgamento.
·        Alternativamente que se entender Vossas Excelência por não conceder a liminar, que determine o sobrestamento do julgamento até que se julgue o mérito deste writ.
·        Que seja concedida a ordem para por em liberdade os impetrante, para que possam dessa forma responder ao julgamento e por via de conseqüência, que seja expedido Alvará de Soltura, com vistas a proteger e resguardar o direito de liberdade de locomoção do PACIENTE.
·        Seja, para fins de sustentação oral, publicada no DJO a data do julgamento de mérito deste.
                Estes são os termos nos quais pede e serenamente aguarda deferimento, por ser essa medida de lídima JUSTIÇA!
São Luis, 21 de Março de 2011.
ROBERTO CHARLES DE MENEZES DIAS.
ADVOGADO, OAB/MA: 7823



[1] LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
[2] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, 3. v., 23. ed., Saraiva, 2001, p. 463.
[3] Min. Edson Vidigal, STJ, RHC nº 2.725-7.
[4] ALMEIDA, Gabriel Bertin de. Afinal quando é possível a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública? Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 44, p. 71-85, 2003.
[5] LOPES JUNIOR, Aury. Introdução crítica ao processo penal – fundamentos da instrumentalidade garantista. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005.

[6] TORNAGHI, Hélio. Op. cit., pp. 1080-101.
[7] Manual de processo penal. Freitas Bastos, v. 1, 1963, p. 270, nota 12