domingo, 20 de fevereiro de 2011

Impasse sobre vagas de suplentes opõe Câmara e Supremo

Uma divergência de interpretação entre a Câmara dos Deputados e o STF (Supremo Tribunal Federal) gerou um impasse entre as instituições sobre quem deve assumir as vagas abertas por parlamentares que deixam os cargos em decorrência de nomeações para o Poder Executivo. A notícia e do jornalista Thassio Borges, do site Última Instância.

Enquanto o Supremo vem consolidando o entendimento de que o mandato —e, por conseqüência, a vaga de suplência— pertence ao partido, a Câmara insiste em dar posse aos suplentes da coligação partidária. Nos últimos meses, a Suprema Corte concedeu liminares para que o cargo fosse ocupado por suplentes dos partidos de origem dos licenciados. A decisão do STF gerou ainda mais mandados de segurança com o mesmo pedido.

Para o professor e advogado Pedro Estevam Serrano, mestre e doutor em direito do Estado pela PUC-SP, é dever do Legislativo acatar as ordens do Judiciário. “A Câmara deve aceitar. É o STF que é o intérprete final da Constituição. Quem decide isso de forma definitiva no sistema nosso sistema é a Jurisdição. O STF irá julgar cada caso, tomará sua decisão e a Câmara deverá aceitar”, afirmou.

No último dia 7 de fevereiro o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afirmou que continuaria dando posse aos suplentes de deputados licenciados conforme o critério de coligações. “A lei estabelece que o suplente é da coligação. Inclusive quando os tribunais regionais eleitorais diplomam o suplente, o fazem na ordem – primeiro, segundo, terceiro e assim sucessivamente. A Câmara vai continuar com o entendimento de que o que vale é a coligação e vai continuar dando posse ao suplente assim”, afirmou Maia.

O presidente do Senado, José Sarney, mostrou preocupação em relação às divergências entre os Poderes Judiciário e Legislativo. Para Sarney, judicializar a política pode deformar o regime democrático.

"Nós manifestamos a necessidade de acabarmos com todas as controvérsias entre o Poder Judiciário e o Poder Legislativo. Quanto menos nós tivermos atritos, melhor para o entendimento entre os nossos poderes", disse Sarney.

Serrano, no entanto, argumenta que nesses casos não há invasão de competência do Legislativo pelo Judiciário e, portanto, as decisões do STF precisam ser acatadas. “A democracia não é ditadura da maioria. O papel do Judiciário é defender as regras do processo eleitoral e defender os direitos fundamentais e a constituição. Quando a decisão da maioria, a decisão legislativa, contrariar as regras do processo eleitoral, a constituição ou os direitos fundamentais cabe ao Judiciário interferir para determinar os limites da decisão dessa maioria”, complementou Serrano, que explicou ainda a individualidade de cada ação deste caso.

"O Judiciário produzirá normas para casos concretos, específicos e individuais, não para toda a sociedade. Só haveria uma invasão da competência do Legislativo pelo Judiciário se o Judiciário estivesse querendo produzir uma norma geral, abstrata. Essa discussão de possível invasão de competência do Legislativo pelo Judiciário nem deveria se colocar, pois os casos são individuais e estão sendo julgado pelo Judiciário de forma específica, individual mesmo", completou.

Ainda assim, a divergência segue. Até mesmo uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) foi protocolada no último dia 9 pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) para regulamentar a questão. A proposta prevê que serão convocados os mais votados na legenda e no caso de partidos que concorreram às eleições como coligações, assumirá a vaga o mais votado dentro da coligação.

“Essa PEC, que acabamos de protocolar na mesa, vem ordenar isso. Para que o suplente seja o da coligação a ocupar o cargo daquele que se licenciou”, explicou Caiado.

O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Ricardo Lewandowski, que também integra o Supremo, defendeu que a vaga fique com os suplentes das coligações, mas reconheceu que sua posição é atualmente minoritária na Corte.

Na Câmara, além da PEC de Ronaldo Caiado, já há uma movimentação para defender os suplentes das coligações. Segundo a coluna Radar On-line, da revista Veja, o procurador parlamentar da Câmara, Nelson Marquezelli deverá enviar um parecer ao STF em defesa da posição da Casa.

Fidelidade Partidária

Para se entender o imbróglio, é necessário recorrer ao ano de 2007, quando o STF decidiu que os mandatos pertencem aos partidos. Tal decisão era uma resposta às constantes trocas de partidos efetuadas pelos parlamentares.

No entanto, a perda do mandato não era imediata. A Justiça Eleitoral deveria, a partir daquele momento, analisar caso a caso, permitindo a defesa dos dois lados. Com isso, nos meses seguintes, diversos casos foram ajuizados pedindo as vagas de parlamentares eleitos para suplentes do partido.

Em dezembro de 2010 o problema voltou à tona após decisões recentes do STF. À época, o Supremo determinou que a vaga decorrente da renúncia do deputado Natan Donadon (PMDB-RO) fosse ocupada por Raquel Duarte Carvalho, primeira suplente do partido. O mandado de segurança impetrado pela Comissão Executiva do Diretório Nacional do partido pretendia reverter a decisão do então presidente da Câmara, Michel Temer, que convocava Agnaldo Muniz, primeiro suplente da coligação “Rondônia Mais Humana" (PP, PMDB, PHS, PMN, PSDB e PT do B), para assumir a vaga.

O PMDB havia afirmado ao Supremo que Muniz não pertencia mais ao PP e, na época, era suplente do PSC. Os ministros Dias Toffoli, Ayres Britto e Ricardo Lewandowski abriram divergência, afirmando que a coligação tem todo o ônus, participa da campanha eleitoral com recursos humanos e materiais, concorre para a formação do quociente eleitoral, consegue diplomar seus suplentes e, portanto, não pode ser excluída por se desfazer após as eleições.

A polêmica inspirou outros casos como os dos deputados federais Zé Carlos da Pesca, do PP-BA e João Destro, do PPS-PR. Os dois contestavam decisão da Mesa da Câmara que determinava a posse dos primeiros suplentes das coligações e não dos partidos em vagas deixadas por parlamentares que foram nomeados para cargos no Executivo.

Com as determinações do STF, caberia então à Câmara dos Deputados decidir nos dias seguintes se acataria ou não as decisões do Supremo.

Além de manter a posse dos suplentes da coligação, Marco Maia afirmou ainda que a solução para o problema viria do Congresso e não do Supremo. "Nós, na Câmara, vamos tratar desse assunto nos próximos dias e provavelmente caminhamos para uma solução que venha do Legislativo e que possa, a partir do Legislativo, pacificar essa questão e esse entendimento. Vamos dialogar com os líderes partidários durante esta semana para tentar construir esse processo e esse projeto a partir da Câmara dos Deputados”, complementou o presidente, citando que a decisão será baseada em uma regra já existente.

"Vamos tentar pacificar isso a partir da ideia de que tínhamos uma regra existente, que era a regra de eleição dos suplentes a partir da coligação e que orientou a composição das coligações, dos candidatos que concorreram na última eleição. Então, esse será o esforço que nós faremos", concluiu.

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