Advogados são líderes naturais. Promotores,
idem. Se deixar, eles tentam controlar o réu, as testemunhas, os
jurados, os funcionários do tribunal e até o juiz, se ele se descuidar.
Não acontece porque o juiz não deixa. Mas há situações em que o advogado
e o promotor devem manter as testemunhas sob rédeas curtas. Isto é,
devem fazer "perguntas indutoras" de respostas (leading questions), dizem os advogados e professores de Direito, Elliott Wilcox (Trial Theater) e Paul Sandler (The Art of Advocacy), em artigos separados.
Há
duas justificativas para isso, dizem. A primeira é economizar tempo de
julgamento. Nisso, advogados e promotores devem trabalhar em conjunto.
Todas as perguntas a testemunhas, cujas respostas não têm peso na
produção de provas, devem ser formuladas para tentar induzi-las a
responder "sim" ou "não". São perguntas, por exemplo, que visam a
identificação da testemunha para os jurados ou que se referem a fatos
que estão devidamente descritos nos autos, às vezes até repetidamente.
Fatos que nenhuma das partes contesta.
A função da pergunta
indutora, no caso, é fazer com que a testemunha se limite ao que
interessa no processo, apenas. Por exemplo: "O senhor estava do lado de
fora do posto de gasolina tal, na esquina da rua tal com a rua tal,
quando ocorreu o acidente, às 20h do dia 24 de agosto. Correto?
Resposta: "Sim". Esse tipo de pergunta evita que a testemunha conte uma
longa história. Se a pergunta for aberta, como: "O senhor presenciou o
acidente, às 20h do dia 24 de agosto?", a resposta pode ser: "Olha, eu
saí do trabalho um pouco mais tarde aquele dia... aconteceram uns
probleminhas lá na firma...o que não é normal". O exemplo é simples, mas
retrata uma situação corriqueira nos tribunais, dizem os professores.
No
caso em que as perguntas indutoras são usadas como técnica de
inquirição de testemunhas, é preciso distinguir entre inquirição cruzada
(cross-examination) e inquirição direta (direct examination).
No Direito anglo-americano, a separação desses sistemas faz parte do
cotidiano dos tribunais. A inquirição cruzada é a que um advogado (ou
promotor) interroga a testemunha da outra parte. Nesse caso, as
perguntas indutoras devem ser sistematicamente usadas, recomendam os
professores. A inquirição direta, por sua vez, é aquela em que um
advogado (ou promotor) interroga a testemunha que ele mesmo arrolou.
Nesse caso, as perguntas indutoras não devem ser usadas.
Na
verdade, elas são proibidas no sistema americano. A outra parte pode
protestar e terá a concordância do juiz. A não ser no caso das perguntas
preliminares ou que tratem de fatos que não estão em disputa. De outra
forma, o julgamento "pode durar uma eternidade", dizem. E a não ser,
também, em casos de inquirição de crianças, de idosos e de testemunhas
hostis. Elas também são aceitáveis, muitas vezes, quando o advogado quer
introduzir um tópico novo na inquirição, que pode ficar mais claro — e
mais específico — com uma sentença afirmativa que antecede a pergunta.
A
principal razão para coibir perguntas indutoras em inquirição direta é
simples: a testemunha é aquela que está sentada no banco das testemunhas
— não o advogado ou o promotor. É ela que está sob juramento — o
advogado e o promotor não estão. A prova testemunhal deve vir dela e não
do interrogador. É ela que os jurados querem ouvir e observar. O
comportamento, a atitude, a forma de se expressar, a linguagem corporal e
o caráter da testemunha podem conter informações preciosas para os
jurados. "Se tudo que eles ouvirem for "sim" ou "não", como podem
avaliar o testemunho?", pergunta Elliott Wilcox.
Muitas vezes, o
advogado (ou o promotor) arrisca uma ou duas perguntas indutoras, depois
de resolvidas as questões preliminares, sem ouvir qualquer protesto da
outra parte. Mas esse é um tiro que pode sair pela culatra, adverte Paul
Sandler, que conta a história de uma "parte" que decidiu tirar vantagem
da bondade alheia. Veja como foi:
Pergunta: Então, Sr. Hill, quando o senhor se aproximou da interseção, estava olhando para o sinal luminoso, correto?"
Resposta: Sim
Pergunta: Assim, o senhor observou que o sinal estava verde para quem trafegava na mesma rua que o senhor estava, certo?"
Resposta: Sim
Pergunta:
Obviamente, o sinal da rua que cruza estava vermelho. E o senhor viu
quando o veículo Humvee, de cor amarela, avançou o sinal vermelho,
correto?"
Assim continuou o interrogatório, até que toda a
história foi contada, sem que a outra parte protestasse uma única vez. O
caso parecia ganho. Tudo indicava que a deliberação do júri sairia em
menos de cinco minutos. Mas, a outra "parte" reverteu a situação,
durante as alegações finais.
"Senhores jurados, não sei se os
senhores concordam, mas para mim ficou claro que a ‘outra parte’ não
confia em sua testemunha. Notaram que ele não deixou sua testemunha nos
contar o que aconteceu?
Provavelmente, ele sabia que sua testemunha não
sabe realmente o que aconteceu ou não tem certeza de nada, de forma que
ele contou toda a história, como lhe convinha, e só atribuiu a sua
testemunha a tarefa de dizer "sim". Aliás, se ele tivesse colocado um
boneco no banco dos réus, com a capacidade de balançar a cabeça para
baixo e para cima, afirmativamente, teríamos obtido exatamente o mesmo
testemunho. Concordam?", perguntou com um sorriso.
Arriscar
perguntas indutoras fora de hora também pode ser desconcertante, se a
outra parte protesta. Se isso acontecer, há conserto, diz Sandler. Uma
forma é, depois de pedir desculpas, concordar prontamente em reformular a
pergunta e, desta vez, usar o "se", de forma a guiar a testemunha para a
resposta esperada, da mesma forma. Por exemplo, a pergunta direta
seria: "Na noite do acidente estava chovendo e a pista estava
escorregadia, correto?". A alternativa: "O senhor se recorda se na noite
do acidente estava chovendo e a pista estava escorregadia?" pode levar à
mesma resposta. A pergunta "O senhor foi a um bar depois da recepção,
correto?" pode ser reformulada para: "O senhor pode nos dizer se foi a
um bar depois da recepção?" — a resposta mais provável também será "sim"
ou "não", conforme esperado.
Ambos concordam, no entanto, que
perguntas indutoras podem ser muito eficazes. E não é de se admirar que
advogados e promotores fiquem tentados a utilizá-las na inquirição
direta de suas próprias testemunhas. É frustrante quando a testemunha
troca alhos por bugalhos — algumas vezes porque o advogado (ou promotor)
faz uma pergunta vaga. Perguntas vagas podem levar a respostas desastrosas.
Wilcox
recomenda aos alunos de Direito que pratiquem a elaboração de
inquirição direta, repetindo uma história bem conhecida. A um aluno com
dificuldades para elaborar perguntas indutoras, ele pediu para
representar o advogado do Sr. Coiote, em um processo contra uma
distribuidora de equipamentos, por danos. E a inquirição saiu assim
(todas com respostas afirmativas):
— O senhor é conhecido como "Coiote", correto?
— Seu trabalho é tentar capturar o Papa-Léguas, certo?
—
Em 23 de março do ano passado, o senhor fez um pedido de um propulsor a
jato, que pode ser atado em suas costas, à Empresa Ltda. Sim ou não?
— O senhor também encomendou patins de rodas. Sim ou não?
— A empresa entregou suas encomendas no dia 11 de maio do mesmo ano, correto?
— No dia seguinte, o senhor atou o propulsor a jato em suas costas, seguindo o manual de instruções da empresa, certo?
— O senhor também atou seus pés aos patins conforme orientado pelo manual da empresa, certo?
— Já equipado o senhor escutou o "bip-bip" do papa-léguas e acendeu o disparador do propulsor a jato. Sim ou não?
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