Tribunais de Justiça estaduais com alta taxa de congestionamento de
processos no primeiro grau apresentam significativo número de
funcionários desviados para a segunda instância - inclusive sem
definição do cargo em comissão ou de confiança -, ou até deslocados para
funções estranhas no Executivo e no Legislativo. É o que revela
mapeamento inédito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que cotejou os
dados sobre o efetivo fora de suas áreas e os reflexos dessa situação
na morosidade que marca a rotina das comarcas da Justiça.
O período pesquisado pelo CNJ abrange o ano de 2010. São
2.638servidores fora de suas funções, dos quais 581 preenchem cargos em
prefeituras, câmaras municipais, governos estaduais e assembleias. Do
grupo de funcionários 'exportados' para outros poderes, 363 representam
ônus para o Judiciário, ou seja, seus subsídios são pagos pelos
tribunais.
A média geral indica que a taxa decongestionamento no primeiro grau é
de 64,9 (para cada 100 processos, 64,9 estão sem julgamento), enquanto
na segunda instância ela cai para 48,2.
O TJ de Goias, assinala o estudo, é campeão dos desvios de funções.
São 304 serventuários de primeiro grau cedidos para funções de confiança
na segunda instância, que abriga os desembargadores. Outros 52
funcionários estão à disposição do TJ semcargo em comissão ou função de
confiança conhecidos.
O TJ do Piauí lidera o ranking de congestionamento na base - taxa de
84,2. Ao mesmo tempo, o patamar de lentidão na segunda instância é zero.
A pesquisa indica que 46 serventuários ocupantes de cargo efetivo de
primeiro grau estão no segundo grau sem cargo em comissão ou função de
confiança. Outros 23 estão no TJ com funções indicadas e 23 fora do
Judiciário, na administração pública direta e indireta.
O TJ de Pernambuco mantém 210 servidores à disposição do Executivo e
do Legislativo - a corte é a número 1nesse quesito -, dos quais 165 com
ônus para a corte."O desvio é impressionante, chega a ser uma aberração
que penaliza a primeira instância e o jurisdicionado", adverte a
corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, que hoje vai
levar ao Plenário do CNJ seu voto sobre a demanda. "Vou propor o
remanejamento desses cargos e instauração de procedimento de controle
para exame dos atos administrativos que deram origem aos desvios
funcionais", disse Eliana.
A ministra vai sugerir prazo de 30 dias para que todos os TJs
regularizem a situação. Ela tem ciência de que está tocando em uma área
sensível da toga, assim como fez quando abriu inspeção sobre pagamentos
milionários."Isso (os desvios) está enraizado, estou mexendo com uma
cultura dos tribunais. No CNJ não creio em resistências, mas nos
tribunais eu tenho certeza que isso vai ocorrer. Mas alguma coisa
precisa ser feita."
O TJ de Goiás informou que os desvios não existem mais em hipótese
alguma, com a aprovação, em2012, de uma lei específica de cargos na
corte.
No Piauí,o juiz auxiliar da Presidência do TJ, Virgílio Madeira
Martins Filho, disse que o Judiciário "enfrenta sérias dificuldades,
porque 23 das 96 comarcas do Estado estão sem juízes." O TJ de São
Paulo, com 16 funcionários do primeiro grau a serviço do segundo,
informou que vai aguardar a deliberação do CNJ. O TJ do Espírito Santo
anotou que nenhum servidor está deslocado para outro poder.'
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