Passando a atuar, praticamente, como um legislador substituto, o juiz
agora poderá combinar lei anterior e a nova em favor do acusado - é
assim que está sendo elaborada a proposta do anteprojeto de lei para o
novo código penal. O ponto foi bastante discutido, nesta quinta-feira,
dia 10, pela Comissão de Juristas criada pelo Senado para apresentar uma
proposta do Novo Código penal. A reunião foi presidida pelo ministro do
Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp. No primeiro turno de trabalho
do dia, a comissão tratou da parte geral do código, que inclui
princípios gerais, interpretação e aplicação das normas penais.
O debate tratou do procedimento a ser adotado pelo juiz diante de um
caso quando começar a vigorar uma lei que seja apenas parcialmente mais
favorável ao réu. A Constituição permite que se aplique retroativamente a
lei penal mais favorável, mas persiste lacuna diante de uma lei nova
benéfica apenas em parte. “Hoje o próprio Supremo está dividido: aplicar
globalmente a lei nova ou a lei globalmente mais favorável ou ainda
trechos de uma e de outra lei. Combinar leis foi a solução aprovada,
embora não tenha sido o meu voto", comentou o relator do anteprojeto,
procurador-regional da República Luiz Carlos Gonçalves, defensor da tese
vencida.
Na linha definida de incorporar ao texto a doutrina, outra proposta
aprovada pelos juristas deixa claro que, diante de um conflito de
normas, o juiz deverá observar a mais específica. Isso significa dizer
que, diante de um infanticídio, por exemplo, o magistrado usará as
regras penais para esse tipo de crime em vez de aplicar as normas
definidas para o homicídio, de natureza mais genérica.
Crimes no exterior
A aplicação da lei brasileira no caso de crimes contra o presidente da
República, quando o delito é cometido no estrangeiro, deve ser
estendida a todos os ocupantes de cargos que integram a linha
sucessória: pela ordem, o vice-presidente, os presidentes da Câmara dos
Deputados e do Senado e o presidente do Supremo Tribunal Federal.
A inovação também foi aprovada pela comissão. Seus membros ampliaram a
abrangência dos delitos, para determinar que a lei brasileira seja
aplicada não apenas nos casos de crimes contra a vida ou a liberdade
(como estabelece o código vigente) do presidente e dos que ocupem a
linha sucessória quando se encontrarem no exterior. Pelo novo texto,
serão enquadrados os crimes que "ofendam de qualquer modo a vida ou a
liberdade" dos ocupantes desses cargos. "Por exemplo, o latrocínio não é
crime contra a vida nos termos do Código Penal; é um crime contra o
patrimônio. Com a nova redação, esse crime passa a ser também
compreendido", explicou o procurador Gonçalves.
A comissão também sugere incluir entre os crimes extraterritoriais
sujeitos à lei brasileira os que objetivam lesar ou expor a risco a
ordem constitucional e democrática. Como no caso dos crimes contra o
presidente e sucessores, esses delitos são incondicionados: o processo
será levado adiante mesmo se o agente não se encontrar no Brasil ou se o
ato não for considerado crime no país onde foi praticado. Os crimes
extraterritoriais contra a administração, o patrimônio ou a fé pública
da União, no entanto, passam a ter outro tratamento: ficam na
dependência do ingresso do autor do delito no Brasil ou de sua entrada
mediante extradição.
Novas reuniões
Nova reunião da comissão está prevista para esta sexta-feira, 11, a partir das 9h, quando devem ser examinadas propostas relacionadas a delitos cibernéticos (atualmente sem regulamentação específica), contra a relação de consumo, interceptação telefônica, milícias e lavagem de dinheiro. Na segunda-feira, 14, a comissão ouvirá a comunidade jurídica e a sociedade civil do Rio de Janeiro, para exame dos pontos já aprovados e coleta de novos subsídios. O evento será na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, a partir das 13h. Está ainda prevista audiência em Porto Alegre, na próxima sexta-feira, 18, no auditório da Escola da Magistratura do Estado do Rio Grande do Sul, a partir das 14h.
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